quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Desgosto fotográfico



A história tem perto de quarenta anos.
Vi no peitoril da janela um insecto. Pequenito e não voador, recordo que tinha cores bonitas e diferentes. E achei que era um bom assunto para fotografar.
Mas vários problemas se levantavam.
Desde logo o seu tamanho. Os menos de dez milímetros que possuía implicavam recorrer a técnicas de macro fotografia, pelo que decidi usar a objectiva de 50 mm invertida no corpo da Pentax LX. Esta técnica, que permite uma escala de reprodução bem grande, implica uma igualmente grande proximidade ao assunto, uns 20 mm, mais coisa, menos coisa.
Para a iluminação, haveria que recorrer à luz natural e reflectores, já que a proximidade inviabiliza o uso de flash, anelar ou clássico.
Assim, e decididas estas questões de cariz técnico, usei de um copo de vidro para evitar que o bichinho se fosse embora. Não me passaria pela cabeça fazer-lhe mal e iria liberta-lo assim que o fotografasse.
Mas o coitado não estava lá muito pelos ajustes, e não havia forma de estar parado. Fora do copo fugiria, dentro dele, e visto da abertura, ficava fora de foco e através do vidro com distorções de imagem. Que fazer?
Usando dos recursos existentes em casa e de um pouco de imaginação, concebi um dispositivo:
Sacrifiquei uma caixa de filtros, com uns 60 mm de diâmetro e, numa das metades, cortei-lhe o fundo. No seu lugar, colei-lhe uma placa de vidro, do tamanho dos filtros Cokin, que tinha mandado fazer para uma experiências com filtros neutros feitos com negro de fumo. (São fáceis de fazer mas um cuidado se impõe: a chama muito próxima pode partir o vidro com o calor)
Fiquei assim com o que necessitava: um recinto para conter o bicharoco e com altura e luz suficiente.
Montei todo o dispositivo (câmara em tripé, caixa, luz), assegurei-me da quantidade e qualidade de luz e foco e tratei de transferir o animal do copo para a caixa.
Quando coloquei esta sob a objectiva e espreitei pelo visor, ainda fui a tempo de ver os últimos estertores do pequenote. Esperneava e contorcia-se, enchendo com a sua agonia todo o enquadramento. E morreu!
Doeu-me! Juro que me doeu fundo na alma! Pela sua morte não desejada e que procurara evitar e por não perceber o que se passara. Só após uma análise aprofundada da situação dei com a coisa: os vapores da cola que tinha usado tinham intoxicado o insecto.

Até àquela data nunca tinha pensado seriamente no assunto. Mas os conceitos estavam cá, não teorizados ou definidos. Mas ficou perfeitamente claro para mim na altura:
O meu prazer fotográfico – egoísta, pela certa – não justifica em nenhuma circunstância a morte de animal ou planta!
Ou bem que consigo a imagem pretendida respeitando a vida e a integridade do ser vivo a fotografar, ou vou à procura de qualquer outra coisa onde assentar a minha objectiva.

Que a ética e o respeito pela vida não passa apenas pelos humanos!

By me

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

CMYK




E se não virem bem o K calibrem o monitor, desligando-o.

By me

terça-feira, 29 de agosto de 2017

Aborrecimentos



Na antecipação das eleições autárquicas, vieram asfaltar a minha rua.
Em boa verdade não a vieram asfaltar mas antes colocar um tapete de asfalto novo em cima do já existente. E só em parte da rua, onde alguém decidiu que faria mais falta. Ou onde seria mais notória a intervenção.
Nada que nos surpreenda, que esta é a época de oiro dos empreiteiros e de quem para eles trabalha, que obras e remendos é o que não faltam pelo país fora.
A maior parte das pessoas agradecem estas obras. O espaço público fica melhorado e todos esperam que não piore durante os próximos quatro anos.
Mas eu tenho um protesto a fazer!
Com esta renovação do tapete rodoviário acabaram as covas, depressões, afundanços e afins. Ou, em alternativa, surgem novas, maiores ou menores dependendo da qualidade do trabalho.
E é aqui que a porca torce o rabo!
Que eu já estava habituado às covas existentes, conhecendo-lhes as profundidade e a quantidade de água que acumulavam após as chuvadas. E o quando ou quanto me desviar em passando um carro, para evitar os borrifos ou verdadeiras molhas consequentes.
Agora… Agora vou ter que estar mais atento, com um olho no asfalto e outro no trânsito, até aprender de cor qual ou quais os pontos negros da minha rua.

Isto das eleições autárquicas é cá um aborrecimento!

By me

Prós e contras

Seria divertido - se não fosse trágico - ver como as simpatias políticas ou clubisticas acabam por se manifestar quase que em exclusivo em ódios viscerais aos rivais, com uma maledicência feroz, ao invés de demonstrar as qualidades e virtudes daqueles com quem simpatizam.
E o que é mais triste é constatar que quanto mais se odeia partidariamente menos se sabe argumentar sobre as qualidades de quem se prefere. Sem conceitos sociais, programáticos ou económicos que sustentem aqueles que defendem.
Um lembrete a quem alimenta tais ódios:

Ser contra é destruir algo; ser a favor é construir algo. E preferem ter o futuro baseado em destruição ou em construção?

By me

Tempo



Porque hoje é hoje, tenho mais um dia no lombo.
Do que foram todos os outros sei-o, na medida em que a memória e relevância dos acontecimentos fizeram sobrepor uns a outros.
Do que será este só a sucessão dos momentos, e na medida em que os controlar, o dirá.
E entre o que foi e o que será há o este momento, que se torna relevante porque dele falo e o registo.
E não, o relógio não está certo. Melhor: este relógio não está certo nem com a hora legal nem com a hora solar do local onde me encontro. Mas está síncrono com algum ponto do espaço/tempo que conhecemos ou não.
Amanhã poderei dizer, de novo, que tenho mais um dia no lombo. Por ser o dia que é. E será tão importante, ou não, dizê-lo amanhã como o é dizê-lo hoje ou foi dizê-lo ontem.
Excepto que a cada dia que passa, depois de cada instante que vivo, estou bem mais rico em saberes e emoções. E, para mim, é isso que conta.


Já o tempo… bem, está farrusco lá fora.

By me

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Parece que foram enviadas quase cinco mil vacas para a Sibéria.

Se um destes dias virem alguma com ar triste, acolham-na com carinho: é uma refugiada.
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O nó



Arrumações dá nisto: tropeçarmos em coisas de que nem nos lembrávamos ou mesmo sabíamos que ainda existiam.
No meio do pó dos livros (saiba-se que é, também, o nome de uma excelsa livraria em Lisboa) e do pó das caixas, mesmo fechadas, eis que encontro duas preciosidades do passado: dois cartões de estudante, distando entre si um ano apenas.
Tratam-se dos cartões do Liceu D. Leonor, um do ano 74/75 outro do ano 75/76, altura em que frequentei os antigos 6º e 7º anos dos liceus, já então chamados de “curso complementar dos liceus”.
Poupo-vos ao triste espectáculo de me verem sem bigode. Ainda o não tinha deixado crescer na altura e, desde que veio, nunca mais saiu. Tal como vos poupo à evolução do olhar dos 16 para os 17 anos. Não apenas a natural evolução da adolescência, mas uma adolescência vivida naqueles anos, rica de acontecimentos e emoções como poucas, de então para cá. E patente no olhar e no ricto ainda sorriso.
Mas não vos poupo a este pequeno mas sintomático detalhe: o haver ou não gravata.
Se a memória me não falha, ambas as fotografias foram feitas no mesmo fotógrafo em Lisboa. Ainda existia há pouco, ainda que muito modernizado, com outro nome e com o acrescento de “estúdio digital” na tabuleta. Já por lá fui perguntar e soube que os actuais donos são os filhos do que me fotografava, e que já se preparavam para se reformar. Dos arquivos de então, já não há memória.
Mas o que acaba por ter graça é que no verão/outono de ‘74, altura em que a primeira foi feita, ainda subsistia um dever de usar gravata num documento importante. Que o retrato, feito no fotógrafo, era algo de importante! Um ano depois, no verão de ‘75, já a gravata era coisa do passado, que se não usava senão… nem eu sei bem quando.
Ficou-me um semi-hábito. Tenho umas dezenas de gravatas, a esmagadora maioria com o mesmo tema e por brincadeira. Raramente as usei, e sempre as mais discretas e em ocasiões em que fiz questão de não destoar: num ou noutro casamento, num funeral, por dever de ofício numa sessão solene com o papa João Paulo II e, confesso, quando está frio. Que a gravata é para isso que serve: proteger o pescoço.

Sobre as fotografias de passe, do seu uso e do seu fazer, tenho uma ou duas teorias que, em tendo eu tempo e disposição, as passarei para o papel ou ecrã, com respectivas ilustrações.
Mas que nos contam histórias, assim as saibamos ler, disso não haja dúvidas!

Vivam as arrumações e os tropeções, que nos justificam uma pausa apetecida mas não merecida.

By me

domingo, 27 de agosto de 2017

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Em tempos usei tempos o telemóvel numa bolsa, no cinto.
Depois, ouvindo tudo o que se disse sobre as suas radiações e o efeito nefasto na saúde, passei a usá-lo no bolso da camisa.
Caramba! A fazer mal que fosse no coração e não no fígado, para que pudesse continuar a beber.
Agora, considerando a forma como bate desenfreado em certas ocasiões, fico sem saber se será do aparelhómetro se por um qualquer outro motivo.
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O simples facto de haver tanta gente a defender a mesma coisa não significa que estão certos.

Apenas que estão de acordo.
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sábado, 26 de agosto de 2017

Exames



A vida divide-se em três grandes grupos:
No primeiro fazemos um sem número de exames e desejamos sempre ter nota máxima.
No segundo é-nos indiferente o resultado dos exames.


No terceiro o nosso anseio é ser chumbado nos exames.

By me

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

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Só para que conste, foi há 29 anos que ardeu o Chiado, em Lisboa.
A cidade recuperou, mas nunca será a mesma.
Só a título de exemplo, naquelas “megastore” que arderam existiam escadas rolantes desde nem sei quando. O que as tornava em coisa rara na cidade.
Mas a originalidade para nós, hoje, é que os seus degraus eram em madeira, em ripinhas de madeira, ao invés do inexpressivo metal de hoje.
Recordo lá ir na infância e no Outono. E recordo de de lá ter trazido, um ano, uma “canadiana” com capuz. Uma festa de indumentária. Mas a verdadeira festa, para mim, foi o usar as escadas rolantes. Para cima numa, descer na outra, tornar a subir…

Não creio que alguém se atreva a fazer escadas rolantes com degraus em madeira, nos tempos que correm. É pena.
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quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Aviso



Quero uma escola para as nossas crianças que se baseie na igualdade na diferença e na fraternidade.
Não quero uma escola que use ferramentas didácticas que incentivem à discriminação pelo sexo, credo ou cor de pele.
Que os livros e discursos que o incentivem se destinem a adultos faz sentido. A liberdade de expressão também é uma pedra basilar da sociedade que idealizo. Os adultos têm, em princípio, capacidade de discernir entre o que é bom e o que é mau. E o facto de ter em casa a bíblia e o “mein kampf” não faz de mim nem cristão nem nazi.
Mas a criança de tenra idade não sabe fazer essas distinções entre o bem e o mal, o certo e o errado. Aprende-o com os adultos e com aqueles em quem confia.
Darem-lhes instrumentos lúdicos de aprendizagem que incitem à discriminação (sexo, credo, cor) é o equivalente a fazerem-nas frequentar madraças ou juventudes social-nacionalistas: saem de lá convencidas de serem aqueles preceitos os correctos para a vida.
Fazerem crianças aprenderem por livros infantis que o certo é a discriminação (sexo, cor, credo) é equivalente a fazerem-nas acreditar nas teorias criacionistas, considerando como blasfémias as evolucionistas. E isto, recorde-se, acontece em países ditos “civilizados”.

O Index foi horrendo. E ao longo dos tempos temos assistido a diversas queimas de livros, actos quase tão violentos quanto as queimas de bruxas.

Mas no tocante à literatura infanto-juvenil há que ter cuidado com os conteúdos do que se lhes entrega para lerem e aprenderem. Tal como o que lhes mostramos na pantalha.

By me

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Certezas

Há coisas que, neste país, atingem as raias do crime capital.
Dizer mal do clube de bola que está à frente no campeonato é uma delas.
Pôr em causa a “honorabilidade” da mãe do nosso interlocutor é outra.
Corrigir o dito ou o escrito de um jornalista também entra na lista.
Pouco importa o saber ou o domínio na matéria de quem corrige; basta ter sido dito ou escrito por um jornalista para passar a ser verdade universal e cuide-se quem discordar. E é inútil apresentar “pergaminhos”, documentos comprovativos ou testemunhos corroborativos.
Se não for “pesquisado” por quem disse ou escreveu é inútil, incorrecto, falso, objecto de suspeita fatal.
Sempre gostava de saber que termos usa a classe jornalística para classificar quem se atreve a colocar em causa o que dizem ou escrevem.

Mas suspeito que sejam demasiado fortes para os ouvidos da minha avozinha, se fosse viva.

By me

Todo o mundo



Não gostaria de parecer erudito ou mesmo especialista em literatura. Não o sou de forma alguma.
Mas há algo que me faz espécie: A esmagadora maioria daqueles com quem falo sobre o assunto dizem-me desconhecer aquilo a que se costuma chamar “Todo o mundo e ninguém”, parte do Auto da Lusitânia de Gil Vicente.
E espanta-me isto porque é algo que julgo conhecer desde sempre, que é como quem diz, desde os bancos da escola.
Na minha mente, este pedaço sempre terá feito parte dos conteúdos dos liceus e espanta-me que tantos, de idades tão díspares, não o conheçam ou mesmo reconheçam.
Para obstar aos que não conhecem, aqui deixo o texto em causa, ilustrado com um retrato do autor que fui “palmar” algures na net.


Entra Todo o Mundo, rico mercador, e faz que anda buscando alguma cousa que perdeu; e logo após, um homem, vestido como pobre. Este se chama Ninguém e diz:

Ninguém: Que andas tu aí buscando?

Todo o Mundo: Mil cousas ando a buscar:
                         delas não posso achar,
                         porém ando porfiando
                         por quão bom é porfiar.

Ninguém: Como hás nome, cavaleiro?

Todo o Mundo: Eu hei nome Todo o Mundo
                         e meu tempo todo inteiro
                         sempre é buscar dinheiro
                         e sempre nisto me fundo.

Ninguém: Eu hei nome Ninguém,
               e busco a consciência.

Belzebu: Esta é boa experiência:
             Dinato, escreve isto bem.

Dinato: Que escreverei, companheiro?

Belzebu: Que Ninguém busca consciência.
              e Todo o Mundo dinheiro.

Ninguém: E agora que buscas lá?

Todo o Mundo: Busco honra muito grande.

Ninguém: E eu virtude, que Deus mande
               que tope com ela já.

Belzebu: Outra adição nos acude:
              escreve logo aí, a fundo,
              que busca honra Todo o Mundo
              e Ninguém busca virtude.

Ninguém: Buscas outro mor bem qu'esse?

Todo o Mundo: Busco mais quem me louvasse
                         tudo quanto eu fizesse.

Ninguém: E eu quem me repreendesse
               em cada cousa que errasse.

Belzebu: Escreve mais.

Dinato: Que tens sabido?

Belzebu: Que quer em extremo grado
              Todo o Mundo ser louvado,
              e Ninguém ser repreendido.

Ninguém: Buscas mais, amigo meu?

Todo o Mundo: Busco a vida a quem ma dê.

Ninguém: A vida não sei que é,
               a morte conheço eu.

Belzebu: Escreve lá outra sorte.

Dinato: Que sorte?

Belzebu: Muito garrida:
              Todo o Mundo busca a vida
              e Ninguém conhece a morte.

Todo o Mundo: E mais queria o paraíso,
                         sem mo Ninguém estorvar.

Ninguém: E eu ponho-me a pagar
               quanto devo para isso.

Belzebu: Escreve com muito aviso.

Dinato: Que escreverei?

Belzebu: Escreve
              que Todo o Mundo quer paraíso
              e Ninguém paga o que deve.

Todo o Mundo: Folgo muito d'enganar,
                         e mentir nasceu comigo.

Ninguém: Eu sempre verdade digo
               sem nunca me desviar.

Belzebu: Ora escreve lá, compadre,
              não sejas tu preguiçoso.

Dinato: Quê?

Belzebu: Que Todo o Mundo é mentiroso,
              E Ninguém diz a verdade.

Ninguém: Que mais buscas?

Todo o Mundo: Lisonjear.

Ninguém: Eu sou todo desengano.

Belzebu: Escreve, ande lá, mano.

Dinato: Que me mandas assentar?

Belzebu: Põe aí mui declarado,
              não te fique no tinteiro:
              Todo o Mundo é lisonjeiro,

              e Ninguém desenganado.
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Parece que há um governante (ele ou ela) que assumiu em publico a sua homossexualidade. Com direito a notícias de jornal e as respectivas observações nas ruas e redes sociais.
Como se isso tivesse alguma importância! Como se fosse relevante que um ocupante de um cargo público seja homossexual, cego, paralítico ou quejando!
Estaria preocupado se o lugar fosse ocupado por um mariconso sem tomates, incapaz de tomar decisões. Ou alguém cego de alma, que não visse os problemas dos cidadãos.
Agora isto?
Preocupem-se com coisas sérias!
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terça-feira, 22 de agosto de 2017

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“No meio é que está a virtude”, diz o povo.

“Excepto na composição de imagem”, acrescento eu.
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Trocas



Em tempos conheci um fulano.
Com loja aberta no campo da fotografia, completando a sua actividade com aulas e formação na área.
De princípio achei-lhe graça, pese embora ser um tudo ou nada basófias. Apesar disso, fomo-nos encontrado quando os nossos percursos se cruzavam, conversando sobre os temas que nos interessavam.
Nestes temas incluíam-se, muito naturalmente, a formação em fotografia: métodos, estratégias, abordagens, objectivos… Chegou mesmo a comparecer em acções de formação que eu promovia.
Qual não é o meu espanto quando, a dada altura, encontro nas divulgações das suas formações, aquilo que com ele havia comentado e visto, assumindo como inovação pedagógica, quase ipsis verbis, aquilo que lhe havia dito ou a que havia assistido.
Caramba! Estava a assumir como seu, exclusivamente como seu, aquilo que havia aprendido com outrem.
Não gostei e fiz-lhe saber o meu desagrado. Não necessitaria de identificar as fontes do que propagandeava mas, ao menos, que não assumisse a autoria do que não tinha concebido.
A resposta roçou a má educação e a ordinarice. Não as tocou, mas ficou lá muito perto, negando por completo o que lhe dizia.
Encheu-me!
Cortei por completo relações, reais ou virtuais, e deixei de recomendar o seu estabelecimento. Não recomendo a ninguém o fazer negócio com alguém que tenha este comportamento.

Infelizmente, neste mundo desenfreadamente competitivo, o que mais há é quem se aproveite do esforço e boa-vontade dos outros em proveito próprio, incapazes de reconhecer os benefícios que recebem.


Nota adicional: Desceria ao seu nível se aqui identificasse de quem falo. Até porque continua activo no seu negócio.

By me 

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O píncaro do absurdo:
Ficarmos satisfeitos porque alguém tem como ganhar a vida durante quase um ano.

Em tempos havia as vendas em prestações. Agora é a vida em prestações.

Eventuais.
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segunda-feira, 21 de agosto de 2017

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A vida está cheia de coisas divertidas e ternurentas, capazes de encher e alegrar o coração de qualquer um.
O problema está em que os maldispostos de nascença e os diplomados em pessimismo não são qualquer um.

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O ceptro do cobrador



Era um símbolo da tirania! Quando o trinca-bilhetes, agora chamado de pica, se aproximava, todos sacavam do porta-moedas para o óbvio pagamento. A menos que…
A menos que fosse um borlista! Nesse caso não se estava nos bancos, ou de pé, nos quatro lugares marcados junto a varões de ferro plastificados. Mas pendurado na porta, em equilíbrio instável e dependendo dos dedos e da sua força, bem como dos solavancos do autocarro ou carro eléctrico.
E era aqui que a tirania se manifestava, com um valente carolo na cabeça ou uma traiçoeira pancada nos nós dos dedos. O alicate era terrível nas mãos dos façanhudos cobradores da Carris.
Já na ferrovia a coisa era – é – diferente: nem sempre há a garantia de o ver ou ouvir a trincar bilhetes, pelo que era – é – um jogo de caça e caçador o conseguir viajar de borla. Em o ouvindo numa das portas de extremo da carruagem, discretamente os borlistas vão passando para a carruagem seguinte. A menos que já se esteja na última, o que leva a esperar que se pare numa estação para aí sair e esperar pelo comboio seguinte.
Hoje começa a ser raro, pelo menos aqui na capital alfacinha, ver ou ouvir o trinca-bilhetes.
A actual bilhética magnética não se coaduna com os furinhos do alicate, sejam estes redondos, quadrados ou em estrelhinha. Na Carris já não existem e na CP, a breve trecho, também não. Será um símbolo de tirania que desaparecerá, não criando mais histórias ou estórias para recordar.
Porque, de uma forma ou de outra, a simples visão do alicate tem provocado sorrisos francos e nostálgicos. Não sei se das vivências se da vingança de o ver nas mãos de um “civil”. Que o encontrei na feira da ladra, adquirido depois de algum regateio com o velhote que o vendia.
Excepção feita, quanto a sorrisos, a um colega excêntrico que é. Depois de um leve esboço de sorriso, atirou-me com um “Para que queres tu isso?” Mas é um excêntrico!
Das várias estórias que a memória me conta, ressalvo agora uma, mais sensação que acção:
A inveja que sentíamos quando se via algum passageiro confrontar o trinca-bilhetes com o conteúdo da carteira ou o revirar da lapela do casaco. Que, acto continuo, recebia um sorriso de condescendência do cobrador e não lhe tirava o bilhete. Ou obliterava com o malfadado alicate.
Claro que, à época, não me passava pela cabeça que alguns desses passageiros especiais seriam membros da PIDE-DGS de má memória e bem mais tirânica que o alicate, fazendo tremer o pica bem mais que o alicate os borlistas.
Quando, já rapazola e após a revolução, surgiram os passes sociais comprados mensalmente, que alegria ter também algo para mostrar e, assim, fugir do alicate, dos “clac” da furação e dos seus carolos.

Em breve será completamente obsoleto! Ficará aqui este, arrumadinho a um canto, para obliterar ou validar as memórias. E os sorrisos também.

By me

domingo, 20 de agosto de 2017

O copo



Conhecem aquela do fulano que era tão pacato, mas tão pacato mesmo, que nem partia um prato?
Pois!
Cá em casa é mais copos.


Nota adicional: Aqueles que dizem que não têm assunto para fotografar deviam procurar bem mais perto da sua própria existência.

By me

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Sobre o dia de ontem, o Dia Mundial da Fotografia



O actual uso da fotografia recorda-me os maus filmes de cow-boys:
Todos possuem pistolas e todos disparam inconsequentemente sobre todos.
Sem um pingo de responsabilidade, sem um grama de respeito por quem os cerca, sem uma sombra de escrúpulos.
As consequências do acto fotográfico não se resumem a demonstrar a terceiros as eventuais qualidades do fotógrafo, ao ter aquele visão e aquela mestria em registar o que viu.
São também o exibir ao mundo as poses, as expressões, os actos dos fotografados, vezes demais sem sua permissão ou mesmo conhecimento.
Recuso fazê-lo e condeno veementemente quem o faz.

O uso de uma câmara implica responsabilidades éticas que a maioria desdenha em prol de eventuais troféus pendurados na parede ou no mural.
Também os tais cow-boys faziam marcas na coronha da pistola.


Para os quer acham que o mundo é uma coutada de caça e que todos os seres humanos são presas a capturar com os disparos indiscriminados das suas câmaras, os meus sinceros desejos que nunca sejam vítimas dos disparos de outros. E que não acabem embaraçados com a exposição pública do que pensavam ser a vossa vida privada.

By me

Segurança



Foi um destes dias.
Liguei o televisor num desses canais temáticos e foi mesmo a tempo de apanhar o fim de um programa. A voz masculina que se ouvia afirmava, em tom apocalíptico, que devemos usar as tecnologias para vivermos em segurança contra o terror.
Mudei de canal para um outro que nos mostrava uns quaisquer animais que, com a tranquilidade secular, comiam, trepavam às árvores e cuidavam das crias.
É que tenho para mim que esse tal terror se diverte à brava com as tais medidas de segurança da tecnologia – vigilância, inspecção, suspeição – já que elas, as medidas, mais que garantirem a segurança de quem nelas confia, alimentam o tal estado que o terror deseja: medo.
A cada passo que damos, em cada palavra que proferimos, por cada pensamento que temos, ficamos sempre com a sensação que o terror deles se poderia aproveitar contra nós, mas que os vigilantes, que cada vez mais tudo conseguem saber e sobre tudo conseguem agir, nos garantem que podemos estar descansados que eles nos protegem.
E vamos dando graças por eles, os vigilantes, lerem a nossa correspondência, escutarem as nossas conversas, espreitarem os nossos gestos, escrutinarem as nossas bagagens. E os nossos medos, assim alimentados e assim tranquilizados, mantêm-nos na dependência deles, dos vigilantes, para gáudio do tal terror.
Que já nada precisa de fazer, que nós mesmos nos encarregamos de nos aterrorizar.
Paulatinamente vamos cedendo na nossa privacidade, na nossa condição de indivíduos autónomos, capazes de decidir das nossas vidas, em prol de uma sociedade castrante e castrada, qual rebanho que deixa os cães morder as canelas, conduzindo-nos para um redil gradeado e farpado.

Cada vez mais tenho a certeza que os tais do terror vestem fatinhos caros, falam para as câmaras e assinam decretos.

By me

sábado, 19 de agosto de 2017

Crónica sobre uma crónica



Tropeço num artigo de um jornal intitulado “Ladi Di: nem princesa nem do povo”.
Confesso que não me costumo preocupar nem com as questões reais nem com os artigos cor-de-rosa. Mas como não tinha muito que fazer, fui ler esta partilha numa rede social.
Quem o escreveu faz uma longa análise à genealogia da princesa de Gales, falando nos títulos de seus avós e bisavós, chegando mesmo a dar-lhe um parentesco distante com D. Afonso Henriques. Não o discuto porque nada sei da matéria e porque me é muito pouco importante a ascendência, real ou outra.
No entanto, quando o articulista fala em “sangue azul”, não pude deixar de me recordar do absurdo da cor e dos episódios passados em canais televisivos sensacionalistas que atribuem a realeza e a sua importância a uma eventual descendência de extra-terrestres.
Ia lendo e ia sorrindo daquilo que preocupa, eventualmente, aqueles que pouco mais têm para se preocuparem. Inofensivo e inútil.
“Saltou-me a tampa”, no entanto, quando o autor do artigo afirma que “Mais importante que a nobreza do sangue é a do espírito, que se mede pelas acções e, sobretudo, pela atitude de serviço a Deus e à Pátria: ser nobre é, numa palavra, servir.” E continua, referindo a linhagem de Cristo.
“Eh lá! O que é lá isto?”, pensei deixando de sorrir. “Eu sei que este artigo foi publicado no jornal “Observador”, mas isto vai um nico para além do que esperava: é catequismo puro e duro!”
E fui ao cimo da página ver quem o assina e com que título.
Percebi tudo quando li que o autor é Gonçalo Porcarrero de Almada, titulado de padre.

Não costumo ler este jornal. As suas tendências ideológicas, não assumidas estatutariamente, situam-se do outro lado da barricada. E os meus arcabuzes e mosquetes estão atestados sobre quem lá perora. Mais para mais se pensarmos que a sua figura de proa defendia ferozmente, até há não muito tempo, o encerramento da estação pública de televisão e que passou a estar caladinho sobre o tema quando se transformou em comentador regular por lá. Muito provavelmente bem pago para tal.
A liberdade de expressão é constitucional e bater-me-ei para que continue viva e de boa saúde. Tal como o direito a informar e ser informado.
Mas vou ter ainda mais cuidado ao aceder aos escritos de quem se bate por extinguir ou impedir o meu ideal de sociedade, igualitária, fraterna e democrática.
Que é disso que sou feito, com o meu sangue vermelho e proletário.


By me

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

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Há coisas boas na vida.
Uma delas é sair de um local com os olhos a brilharem de esperança no futuro e ver esse mesmo brilho nos olhos de quem te acompanha.

Hoje o dia acabou assim.
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O roubo na esquadra



Quem me contou a estória afiançou-me como sendo verdade e tendo acontecido aqui, algures nos finais dos anos 40, princípios dos anos 50. E como quem ma contou morava nas imediações, até acredito nela.
Um dia o chefe da esquadra da zona terá dito para um seu subordinado que passasse na relojoaria ali da rua para que eles fossem buscar o relógio de parede da esquadra. Andava ele a atrasar-se (ou seria adiantar-se?).
Certo é que, mais tarde nesse mesmo dia alguém se apresentou na esquadra de polícia, dizendo que vinha buscar o dito relógio. E levou-o. Para onde ninguém sabe, que o tipo não vinha a mando do relojoeiro. Seria um larápio que estaria na loja quando o recado foi dado, a preparar talvez um trabalhinho, e ouvindo o recado aproveitou a ocasião.
Falsa ou verdadeira, a estória, serve ela para mostrar que as coisas mais audazes se fazem quando menos se espera e com a maior das naturalidades, ou tudo falha.
Mas, a ser verdadeira a estória, 50 anos depois alguém roubou este prédio mesmo ao lado da esquadra onde se teria passado o insólito acontecimento. A pressão urbanística e imobiliária, aliada à idade provecta do edifício, fez com que fosse derrubado – só ele – para criar este simulacro de rua, que nem sei se terá ao menos nome, para acesso ao bairro das Olaias, por trás.
Ficou assim, com este aspecto, como se alguém tivesse tirado uma fatia do bolo mesmo antes de o colocar na mesa.

O relógio terá ido, até porque efémero o tempo; o imóvel também, até porque já não fazem prédios como antigamente. Ficou a memória de uma estória rocambolesca que, sendo verdade, é divertida; não o sendo, ficamos todos com pena que não o seja.

By me

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Automatismos? Não, obrigado.



Tive um Tio.
Era eu pequenote quando morreu.
Mas recordo ele possuir uma agenda de secretária, grande, muito grande para os meus olhos de então, onde ele tinha anotado tudo quanto considerava de importante. E todos os anos lá copiava ele da velha para a nova.
Pois todos os dias, antes de sair de casa pela manhã, consultava ele a sua agenda e dirigia-se à estação de correios ao fundo da rua. Daí, enviava um telegrama de parabéns a quem quer que nesse dia fizesse anos. Mesmo que o ou a não visse há muito.
Um acto deliberado, consciente, trabalhoso e oneroso.
Hoje temos os “Outlooks”, os “E-Mails”, os “FaceBooks” que nos recordam, queiramos ou não, dos aniversários de quem lá conste. E usando da mesma tecnologia de informação e a custo zero, lá gastamos uns 10 a 15 segundos a mandar os tais “parabéns” descaracterizados, frios, impessoais, electrónicos.
Sendo que acho que não deverá ser uma máquina ou um calendário que deva dizer quando me devo divertir ou cumprimentar quem quer que seja, ignoro esses avisos automáticos.

Quanto ao resto, nada melhor que uma festa de desaniversário, para citar Lewis Caroll. Que, por sinal, até foi também um dos grandes fotógrafos do seu tempo.

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terça-feira, 15 de agosto de 2017

Passagem



O que é idade?
É bem mais que aquilo que medeia entre este momento e aquele em que nascemos.
É aquilo como nos sentimos, bem para além daquilo que o corpo sente.
É aquilo que nos apetece fazer, apesar do que aprendemos, do que nos ensinaram, do que impõem.
É o que leva a que os nos olhos brilhem de desejo, mesmo que proibido.


Que idade tenho, eu que passei para o outro lado, que conduzia a local algum e sem que coisa alguma lá fosse fazer, nem mesmo fotografar?

By me

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

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Parece que Pedro Passos Coelho terá dito que:
“O que é que vai acontecer ao país seguro que temos se se mantiver essa possibilidade de qualquer um viver em Portugal?”
Concordo com ele em pleno!

Só não sei que outro país o acolheria.

"Penso eu de que"



O estado é a maior empresa do país. São centenas de milhar os assalariados que prestam serviços nas diversas áreas, da saúde à justiça, da educação à segurança, da higiene à cultura.
O objectivo desta empresa é a prestação destes serviços aos seus sócios – os cidadãos – e os meios de o fazer provêem das contribuições dos mesmos.
É um sistema em circuito fechado em que, quanto mais ricos forem os sócios e maiores as contribuições, mais e melhores são os serviços prestados! E o contrário é igual e lamentavelmente verdade.
Em princípio mas não inalteravelmente! Mas isto já é outra conversa.

As contribuições dos “sócios” desta empresa fazem-se sob a forma de dinheiro, numa pequena, ou não tanto, percentagem dos seus proventos.
Este dinheiro mais não é que o símbolo do poder ou riqueza de quem o possui, representando os bens detidos ou produzidos pelo seu detentor. É uma forma de fazer equivaler uma vaca a um saco de trigo ou uma dúzia de ovos a um aconselhamento médico ou um par de sapatos a um jogo de copos.
Mas cada vez menos se produzem bens e se aumentam os serviços. Há cada vez menos pessoas a criar vacas ou fazer sapatos ou cultivar trigo. Em compensação, há cada vez mais gente a prescrever medicamentos, a fazer aconselhamento jurídico ou a gerir firmas. A quantidade de serviços prestados aumenta na mesma proporção em que diminuem as produções de bens.
Por outro lado, e para aumentar este desequilíbrio, a população está a envelhecer, o que aumenta o número de consumidores em relação aos produtores.
Consequentemente, sendo o dinheiro uma representação dos bens produzidos e possuídos, este vale cada vez menos, visto que há mais gente a usar que a fazer. E o valor dos bens aumenta em relação ao do dinheiro.

O estado, enquanto maior e principal empresário, regulador da actividade colectiva e grande exemplo para os indivíduos, é, proporcionalmente, o maior prestador de serviços e menor produtor de bens. De riqueza.
Na sua actual filosofia de uma sociedade aberta à iniciativa privada vai, regular e continuadamente, alienando os seus próprios meios de produção de bens, afastando assim a possibilidade de ele mesmo criar riqueza ou, pelo menos, ser auto-suficiente nas suas despesas obrigatórias.
Está dependente da riqueza dos cidadãos, que estão cada vez mais pobres!
O aumento da eficácia na cobrança de impostos e contribuições dos cidadãos é uma medida recomendável mas ineficaz a longo prazo (para não dizer a curto prazo!). É a manutenção de um sistema autofágico que, gradual e inevitavelmente, se deteriorará até à falência total.

A solução passa, parece-me, por o estado, enquanto maior empresário e representante da sociedade, passar a produzir bens, introduzindo-os no mercado e, com isto, não apenas aumentar a riqueza existente em circulação, como dela retirar as mais valias para a sua própria manutenção.
Os grandes empresários, nesta sociedade virada para a iniciativa privada e o lucro, diversificam os seus investimentos, da produção aos serviços. E o resultado é que se vê: sucesso! Porque não fazer o mesmo por parte do colectivo, aprendendo com quem obtém bons resultados?
E com isso manter o principal objectivo do estado enquanto organização que é, em última análise, manter em boas condições e melhorar a vida dos seus “sócios”!

Se, para tal, tiver que ser mudada a lei, tanto a avulsa como a fundamental, faça-se!
Urgentemente!


E contratem-se (ou elejam-se) bons gestores desta mega empresa!

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domingo, 13 de agosto de 2017

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Porquê fotografar



Nem sempre o tempo ou a inspiração do momento é suficiente para explanarmos tudo o que queremos ou como queremos.
Mas porque mo perguntaram, aqui fica o resumo de um sumário minimalista de tópicos das razões de fotografarmos.
Entenda-se que cada um dos temas abordados daria para muitos livros de grossa lombada: alguns que já li, outros que ainda não li e outros que eu mesmo ainda não acabei de escrever.

O fazer de fotografia pode ter vários motivos, uns mais bonitos que outros.
Em primeiro lugar, e para alguns, é um modo de vida, de garantir o pão de cada dia.
Mas pode querer apenas criar algo que não existe: um jogo de luz, cor e formas que, de algum modo, satisfaça a necessidade criativa de quem fotografa.
Pode ser apenas uma moda. Há uns anos, quando comecei, a fotografia era particularmente cara, o suficiente para ser chamada de “hobby”: algo que se faz por gosto mas que esgota os recursos materiais e intelectuais. Agora, qualquer um a pode fazer, que o equipamento de captura e processamento está ao alcance de qualquer um (ou quase). “E se um fotógrafo de renome pode fazer, porque não eu, que basta apontar e disparar?”, será o que muitos pensam ou sentem.
Pode ainda ser uma necessidade de comunicar, que outras formas não satisfaçam. Mostrar o que de belo ou de horrendo vemos é comunicar sentimentos.
Pode ainda ser um acto de exibicionismo, que ao mostrar o que fizemos podemos estar a dizer “vejam como penso e sinto isto!” E, com isto, afirmar a nossa forma de pensar.
Por outro lado ainda, a febre das tecnologias de comunicação fazem com que a imagem faça parte do nosso quotidiano. E comunicar sem se usar imagens é ser-se “out” nas modas modernas. Boas ou más, há que fazer fotografia, de preferência com câmaras ou caras ou vistosas. Será, no entanto, fácil de ver que os bons fotógrafos raramente se exibem falando do que têm mas tão só do que fazem.
Há também um outro motivo possível: cobiça! Não podemos possuir tudo o que gostamos: o pôr-do-sol, o carro, a pessoa. Vai daí, fotografa-se e fica-se com o seu ícone. Não será bem o mesmo, mas é o mais próximo possível.
Ainda se pode acrescentar outra razão: a vida actual é vivida em frenesim, rapidamente e esquecendo com facilidade os momentos que vamos vivendo. A fotografia permite, mesmo que inconscientemente, abrandar o tempo e “guardar para mais tarde recordar”. Claro que, com os Gb dos cartões, câmaras e sistemas de arquivo, não se recorda coisa nenhuma, que tantas se fazem que cada uma deixa de ter importância.
Por fim (ou talvez não) faz-se fotografia porque sim. Pelo mesmo motivo pelo qual se trauteia uma musiquinha, ou se fica parado a olhar uma borboleta no verão, ou porque se dá um beijo: porque nos apetece, nos dá prazer, nos satisfaz naquele pedaço de nós que não tem razão ou, como diria o poeta, “tem razões que a razão desconhece.”
Criar, para alguns, é uma necessidade afectiva; para outros, uma necessidade cultural; para outros ainda, uma necessidade social; e para outros, uma necessidade intelectual. O que diferencia uns de outros é que alguns fazem-no para serem mais que outros. Outros para serem mais que si mesmos.
Em qualquer dos casos, o mais importante será, creio eu, que encontremos satisfação no que fazemos. Porque o fazemos e não porque outros o fazem.

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Umas horas valentes depois de ter escrito o acima exposto, recordei-me de um aspecto, tão ou mais importante que todos os demais por junto: o vício.
Como qualquer outra coisa na vida que se faça amiúde, a dado passo passamos a fazê-la sem que disso os apercebamos. Excepto quando o não fazemos e sentimos que algo nos falta. Entramos, nessa altura, num estado de carência, como se de droga se tratasse.
A partir de certa altura, o fazer fotografia torna-se parte integrante da vida, como pele ou ar e fazê-lo é tão natural como usá-los. Mas é também nessa altura que não o fazer é como ter comichão e não coçar ou querer respirar de boca e nariz fechados.
Digo isto com o saber da experiência feita, mas também com o conhecimento de saber que outros sentem e agem como eu.
A partir de certa altura na vida, fazer um registo de imagem, por mais absurdo que possa ser, é como um corrimão a que nos apoiamos quando estamos em desequilíbrio: vital.
Como que a consubstanciar esta teoria, recordo um velho fotógrafo de imprensa, que conheci no jardim da Estrela. Passeava ele quase todos os dias o seu cão, sempre com uma velha Nikon F, a 50mm e um párasol metálico pendurados no ombro. Ombro esse cuja posição francamente subida bem denunciava o quanto estava habituado a usar aquilo ali pendurado.
Pois este velho fotógrafo, com quem conversei umas duas ou três vezes apenas, já não conseguiria fotografar grande coisa, que bem lhe vi os sintomas da doença de Parkinson. Mas não creio que alguma vez lhe passasse pela cabeça sequer o vir para a rua sem a sua velha companheira. Mais fiel que o canito, p’la certa.

Ser fotógrafo, ou fazer da fotografia a base da existência, é também isto.

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