quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Escrita com luz



Quando primo o botão da minha câmara eu sei quais as consequências:
A luz, que condicionei com a minha objectiva, passa através daquele portão agora aberto e a que damos o nome de obturador, e vai incidir no material sensível à luz que lá se encontra.
Este pode ser uma chapa de metal, um pedaço de vidro, algo tão flexível quanto a película ou mesmo algo tão tecnologicamente complexo quanto um sensor electrónico. A luz incide nele e provoca uma alteração ao seu estado original.
Mas se formos observar esse alvo de destino, nada vemos. A luz chegou, mudou, mas o seu resultado só será constatável depois de tratarmos o alvo.
Nalguns casos, teremos que recorrer a processos químicos, alguns bem complexos, outros nem tanto, de modo a que alteremos o que a luz já alterou: tornar visíveis as modificações físicas.
Noutros casos, teremos que recorrer a complexos sistemas electrónicos para conseguirmos tornar perceptível aos nossos olhos as alterações magnéticas do suporte.
Mas, seja qual for o caso, teremos sempre que fazer algo para vermos o resultado do premir do botão.

E quando o vemos, apercebemo-nos do mesmo: a luz que passou condicionada através da objectiva e que permitimos que chegasse ao alvo, mostra-nos algo que é semelhante ao assunto.
Com maior ou menor profusão de cores e de cinzentos e respeitando a perspectiva, temos algo que é análogo ao assunto.
Claro que é bi-dimensional, claro que não tem o cheiro, nem o som, nem o paladar nem o relevo daquilo que quisemos registar.
Mas se compararmos a imagem obtida e processada e o assunto para onde apontámos a nossa câmara, facilmente encontramos semelhanças, parecenças, analogias, entre ambos. Seja qual for o método usado para a produzir, químico ou electrónico.
Temos assim, e para além de quaisquer dúvidas de cariz técnico, filosófico ou semântico, que toda a fotografia é analógica. Seja qual a metodologia usada para a obter.
E, consequentemente, torna-se absurdo o uso da expressão “fotografia analógica” por oposição a “fotografia digital”.
Chamemos-lhe foto-química, de rolo, à moda antiga, até mesmo batata-frita.
Todas as fotografias, no seu estádio primário são impossíveis de ver, todas as fotografias necessitam de um processamento adequado à sua natureza técnica, todas as fotografias são análogas ao assunto fotografado. Todas as fotografias são analógicas.


O que está mostrado na imagem será, talvez, o único tipo de escrita com luz (fotografia) que não necessita de tratamento especial e cuja analogia com o assunto será discutível.        

By me

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