terça-feira, 14 de julho de 2015

Por causa de um porta-moedas



Fui comprar um porta-moedas.
É daquelas coisas completamente triviais, que se fazem só de muito em muito tempo, quando o que está em uso começa a dar sinais de muita idade. Foi o caso.
O antigo, idoso que é, já tinha as partes metálicas bem à vista, estragando-me os bolsos. E sai bem mais caro remendar ou substituir bolsos de calças a cada seis meses que um porta-moedas a cada seis anos.
Acontece que o modelo de porta-moedas de que gosto começa a rarear no mercado. Dantes comprava-os em lojas baratinhas ou feiras. Mas as primeiras estão a fechar e nas segundas não vão aparecendo os que quero.
Tem-me restado procurar nas lojas de centros comerciais, onde os preços não são convidativos mas onde encontro o que quero. E gosto de usar o que quero e não o que me impingem!
Nesta loja, por onde já tinha passado sem resultado mas com a clássica afirmação “Estamos quase a recebê-los”, lembravam-se do meu pedido. Melhor dizendo, lembrava-se a senhora, quase da minha idade. Que, em vendo-me entrar e passado que era mais de um mês, me disse logo à chegada: “Já cá tenho o que procura”, ainda antes de eu dizer algo mais que a saudação. E tinha.
Analisei o produto, reclamei do preço, mas fiz o negócio.
Quando, no final, ela me faz a agora tradicional pergunta “Quer o número de contribuinte na factura”, respondi-lhe o conteúdo do costume, desta feita um pouco adaptado: “Olhando para si, suspeito que não tem ainda idade para ter andado a fugir à PIDE, ou não me proporia isso.” E fiquei de boca aberta com o que ouvi de volta.
“Não andei bem a fugir a eles, mas quase.”
Conversa vai, conversa vem, e acabámos por estar quase uma hora de paleio. É que, pouco mais nova que eu, fora minha condiscípula no liceu e, para cúmulo, fôramos vizinhos com a distância de poucas ruas.
E ficámos a relembrar outros tempos, outras vivências. Que, para surpresa recíproca, partilhadas. Aliás, partilhadas ao ponto de, quando descrevi alguns dos episódios dos tempos de liceu e do chamado PREC, ela acabar por se lembrar de mim e do chapéu que já então usava. Não em detalhe da pessoa mas de algumas das intervenções sociais que então eu, com outros, fizéramos.
Tal como me recordei do movimento que ela integrara e das intervenções políticas e sociais que fizeram.

É bom saber que, passados quarenta anos, algumas das coisas que fizemos são lembradas com sorrisos. Numa época em que acreditávamos que o futuro estava nas nossas mãos e não apenas depositado, via um boletim de voto, numa urna.

Viva ela e todos os outros que, com ela, fizeram e fazem!

By me

Sem comentários: