sábado, 25 de julho de 2015

O relojoeiro e o fotógrafo



Conheço um relojoeiro.
Já vai sendo raro, este conhecimento: alguém que sabe de mecânica de relógios e os repara.
A maioria dos relógios de hoje são eléctricos e o mais que se lhes pode fazer, em parando, é mudar a pilha. Talvez algo mais, mas não sei o quê.
A própria sociedade está feita, hoje, nesse sentido: Usar e deitar fora, que com isso se alimenta a indústria e o comércio.
Mas este relojoeiro, um pouco à moda antiga, mantém-se no activo, apesar de não ser idoso. Gosta do que faz e, sendo o mercado de reparação de relógios diminuto, complementa-o com o de antiguidades e velharias.
Foi numa feira dessas que o conheci. Vendeu-me um extintómetro, por um preço bem em conta. E, depois do negócio feito, perguntou-me para que servia e como se usava. Lá lho expliquei e ficámos à conversa.
Nessa conversa, ou numa outra noutras ocasiões, contou-me ele que é especializado em relógios europeus e russos. Que é neles que tem o saber e a prática e que só neles mexe. E que quando lhe aparece um cliente com um relógio mecânico japonês o remete para um outro mestre relojoeiro que tem essa especialidade.
Disse-me ele, em tom de brincadeira, que quando tem oportunidade mexe nos japoneses, mas sempre só pelo gozo e nunca fazendo disso depender o trabalho de um cliente.
“Talvez um dia”, disse-me, “complete a especialização nos nipónicos. Até lá fico-me com que sei e tenho por certo.”
Não fora por outros motivos, isto por si só agrada-me neste profissional: tem plena consciência do que sabe e é capaz de fazer e não usa clientes e os seus trabalhos em situações que não domina.
Um dia, em tendo um relógio de pulso europeu ou russo para reparar, é a ele que o vou levar. E, se for japonês, é a ele que vou perguntar sobre quem o faz.
Mas agrada-me ainda uma outra coisa: tendo uma especialidade e um negócio que funciona (mais ou menos, como todos os outros nos tempos que correm), faz questão de não ficar limitado e vai aprendendo outras linhas e especializações.

Mas também conheço um fotógrafo. A bem dizer, conheço alguém que ganha a vida em torno da fotografia.
Possui uma loja, onde vende equipamento e presta diversos serviços, promove formação na área e tem trabalhos editados.
Uma ocasião, estava eu na loja dele de conversa e surge uma mocinha. Vinha para fazer fotografias “de passe”.
Mandou-a sentar no respectivo banco, a um 20cm de uma cartolina branca e fotografou-a com o flash da câmara. Foi ao computador, imprimiu, entregou-lhas, ela pagou e saiu.
Ainda mal ela tinha saído a porta, estava eu a perguntar-lhe porque não tinha ele ali instalado, em permanência, um flash “de recorte”. Bastava um daqueles pequenos, usados, que ali tinha, com uma célula slave, que também tinha, um transformador, até um manhoso. Chegava o banco uns 20cm à frente, palava o flash com cartolina e o resultado seria completamente diferente. Para melhor, claro.
A sua resposta foi de antologia: “Oh JC! Para o que é, isto chega!”

Há bons profissionais e maus atamancadores em tudo quanto é profissão. E, muito honestamente, não há trabalhos menores! Há trabalhos apenas, e todos merecem o mesmo empenho e o melhor que podemos e sabemos fazer.

A honestidade para com o cliente assim o obriga.

By me

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