quarta-feira, 28 de maio de 2014

Liberdade



Quem é ele? Confesso que não recordo o seu nome.
Recordo apenas o local e a história.

Acampamento circense na praça de touros do Campo Pequeno em Lisboa, por alturas do natal.
Acompanhei um amigo jornalista para fazer a reportagem sobre esta forma de arte. A mais detalhada foi sobre este palhaço.
Já teria passado os 60 anos, quase de certeza. Toda a sua vida fora palhaço, sempre em circos de terra em terra.
Entre as muitas que contou, ficou-me apenas esta:

O circo fora em digressão ao Açores. É complicada a logística de levar um circo a um arquipélago. Assim, seguiram apenas as tendas dos espectáculos e as viaturas para os animais. As residências (tendas e roulotes) dos artistas e demais técnicos ficariam cá e por lá dormiriam em pensões.
Este palhaço não se aguentou.
Foi incapaz de dormir em quartos feitos de pedra.
Atabafava, não respirava, sentia-se mal.
Interrompeu a digressão e regressou ao continente.

Naquele espaço exíguo onde nos recebeu orgulhoso, a sua casa sobre rodas, apinhada com quase todos os objectos habituais numa residência acrescidos dos do ofício de palhaço, senti-me mal. Preso a convenções, amarrado a hipotecas, dependente de cartões e números impressos…

Lembrei-me, na altura e agora, de uma outra história que se contava sobre o maestro José Atalaya:
Quando afastado de sua casa, dormia numa auto caravana. Todas as noites decidia onde queria acordar no dia seguinte e de onde queria ver o nascer do sol.


Quem diz que a felicidade passa por um palácio com muitos quartos, brocados nas janelas e cobertas de seda?

By me

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