terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Crime, digo eu!



Talvez já tenhamos partilhado o mesmo comboio muitas vezes. Não o garanto, que nem sempre entro na mesma porta. Mas já dei com elas e partilhámos os mesmos bancos uma meia dúzia de vezes.
Entram na estação a seguir à minha, mãe e filha. Esta terá uns onze anitos, talvez. A mãe uma trintona bem medida.
Tal como eu, e muitos outros, fazem questão de transformar o tempo ferroviário em tempo útil. E se a maioria o faz aproveitando para ler, ouvir música, mesmo fazer tricôt (este mais raro) ou observado e/ou escrevendo como eu, estas usam o tempo para tratar de coisas de escola. Fazem questão disso.
Melhor: a mãe faz questão disso, pedindo para ver os trabalhos da filha, pedindo para ver os recados da escola, instigando a filha a fazer os TPCs, corrigindo-os…
A petiza está a aprender francês. O que não é convencional, tal como não é comum a mãe tanto saber da língua: vocabulário, gramática, sotaque mesmo. Suspeito que será a língua materna, ou equivalente.
O que também não é comum é a forma como a mãe trata a filha. Ríspida, agressiva, bruta, violenta. Nunca com gestos ou contactos. E nas palavras usadas não consta uma única que não seja correcta. Sempre sem um pingo de ternura mas aparentando apenas se preocupar com resultados. Mas a forma de falar… Se fosse minha mãe rifava-a!
Creio que a catraia pense o mesmo. O seu ar infeliz, a forma como olha em redor em a mãe não a estando a ver como que a pedir ajuda, submissa e obediente… é de meter dó!
Nunca vi esta pequenita a rir ou mesmo sorrir, a falar de brincadeiras ou episódios com as amiguinhas. Apenas os deveres, os deveres, os deveres.

Fala-se muito na actualidade da exploração infantil. Em como o colocar crianças em fábricas ou campos é crime. Que lhes rouba a infância. Que não lhes permite crescer naturalmente, com a alegria e energia próprias da idade.
Verdade!
Mas é igualmente verdade que a competitividade na escola, o ter que ser bom, muito bom, o melhor, é tão mau quanto isso. Muito pior!
Que sendo certo que cada criança tem o seu próprio ritmo de aprendizagem, e variando com conteúdos, exigir deles a excelência plena em tudo quanto é estudo é tão mau ou pior que os colocar a coser solas à luz de um candeeiro de petróleo.

Talvez que um dia, em que eu vá trabalhar mais mal disposto (o que é particularmente raro) e as encontre, faça algo. Talvez que uma conversa séria, clara, tão agressiva quanto esta mulher está a ser para com a filha. Apenas terei que ter o cuidado que não seja percebido pela pirralha.
Ou, em alternativa, uma carta explícita guardada no saco e entregue à mãe sem mais explicações. Ela que a entenda, se disso for capaz.

A algumas pessoas não deveria ser dada autorização de procriar. Este parece-me ser um desses casos.

By me

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