terça-feira, 19 de março de 2013

Parabéns, ou talvez não




Está quase a fazer anos. Mais dias, menos dias, faz anos esta história.
Estávamos em 1975. Na sequência da revolução, deixara de haver escolas e liceus masculinos e femininos. E eu havia transitado do Liceu Padre António Vieira para o Liceu D. Leonor, ambos em Lisboa.
O ano lectivo 74/75 havia começado tarde, face às confusões naturais de todas as mudanças que aconteciam e fazíamos acontecer. E o facto de passarmos de ensino segregado para ensino misto não veio ajudar em nada aa esse iniciar a aprendizagem em liberdade.
Por tudo isso, bem como pelos fulgores da juventude agora assim “misturada” e pela já avançada idade do material escolar, chegámos à Páscoa com falta de cadeiras, mesas, carteiras, nas salas de aula. Creio que não foram capazes de resistir ao que acontecia. E as cadeiras partilhavam rabos, nem sempre com os melhores resultados físicos ou académicos.
Certo é que eu, estudante do então sexto ano do liceu, junto com uma valente mão-cheia de colegas, eles e elas, passámos boa parte das férias da Páscoa no sótão do liceu, a tentar recuperar o material danificado que aí se encontrava.
Enquadrados por um solícito continuo, manejamos chaves e martelos e serras naquelas madeiras demasiadamente rijas para os nossos hábitos. Com as consequentes bolhas nas mãos e uma ou outra arranhadela sem consequências.
Não recordo números, mas bastantes foram as que saíram dali para as salas de aula, suponho que capazes de resistir por mais algum tempo àquela formidável maré de gente jovem.
Gente jovem essa que acreditava ter o futuro nas suas próprias mãos e que trabalhava por ele. Com as ferramentas de marceneiro, com os cadernos e livros, com pás e enxadas nos jardins, vassouras nas calçadas… Acreditávamos que as coisas tinham que acontecer e que nós estávamos ali para lhes dar corpo.
Creio que dessa época ainda sobramos alguns dinossáurios, que continuamos a acreditar que do céu só sol e chuva e que o futuro sai das nossas mãos. Ma seremos poucos.
Os restantes de então e os que entretanto vieram acreditam e agem partindo do princípio que “alguém” cuidará das coisas, através de concursos públicos ou contratando alguém para o fazer. Principalmente se se tratar de situações que obriguem a sair da zona de conforto e fazer algo que não reverta directa e imediatamente para o próprio.

Está quase a fazer anos que esta história aconteceu. Alguns dos que comigo a viveram estão por aí para a relembrar.
Mas não sei, com toda a franqueza e olhando em redor, se tenho vontade de sopras as velas deste aniversário.
Que sabemos que o tempo não volta para trás e que a história se repete, mas nem sempre nas suas melhores vertentes. Ou com melhores protagonistas.

By me

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