sábado, 20 de outubro de 2012

O governo e o regime




Por muito que possa parecer o contrário, eu não quero que este governo caia.
Isto porque, e usando as palavras desta senhora, com a sabedoria que o tempo lhe deu e em frente ao palácio de São Bento, “Atrás deste vem outro igual ou pior”. Quer seja de iniciativa presidencial ou fruto de novas eleições.
É que o problema actual não advém do governo, este ou outro.
Está, antes sim, na forma como os governos funcionam, como os seus membros chegam aos respectivos lugares e como se relacionam com os cidadãos. E vice-versa: como os cidadãos se organizam, como as suas ideias são (ou não) postas em prática e como eles, cidadãos, se responsabilizam pelas suas próprias decisões.
Por outras palavras, o que ponho em causa é a forma como a nossa sociedade se organiza, governa e deixa governar.
No sistema actual, os cidadãos elegem o presidente da República, elegem os deputados e desinteressam-se da governação. E tanto o presidente quanto a assembleia, de onde é escolhido o primeiro-ministro, passam a fazer o seu trabalho autisticamente, sem que as suas decisões possam ser objecto de mudança por parte dos cidadãos.
Aliás, bem definidor deste sistema hermético, é o uso das expressões “sociedade civil” e “classe política”. Uma separação total, em que se dá a entender que a segunda, sendo uma elite, tem plenos poderes para decidir sobre a primeira, goste-se ou não das decisões.
Aquilo que quero, mais que a queda de um governo, é a alteração do regime!
Alteração de leis e alteração de consciências. Os representantes do povo têm que poder ser responsabilizados por este. Têm que poder ser questionados, um por um, sobre o seu trabalho na gestão da coisa pública.
Não podem, os representantes do povo, ser mais fieis a uma disciplina partidária, definida por um comité central ou secretariado nacional, que ao povo ou eleitores. Até porque um partido político é uma associação privada, como um clube ou um condomínio, onde só entra e age quem os seus membros decidem. Ver o país gerido por associações privadas é o mesmo que privatizar a gestão da coisa pública. Saber que são associações privadas que definem as leis que regem um povo não é, de todo, a definição de liberdade ou mesmo de democracia.

Portanto, eu não quero que o governo caia! Quero, antes sim, que o regime caia e seja mudado radicalmente!
Quero poder interpelar na cara quem me representa. Quero que todo e qualquer cidadão possa intervir directamente na feitura das leis nacionais, sem ter que ser filiado num clube privado.
Quero que a vontade do povo seja, de facto, considerada como vontade a cumprir e não apenas como ruído de fundo durante reuniões de elites.

O conceito de “Acracia” é demasiadamente elaborado e responsabilizante para ser considerado como possível nas próximas gerações. Mas o regime democrata representativo é por demais autista e hermético para que possa servir os anseios do povo. Tal como não é respeitador da liberdade dos cidadãos. Liberdade de pensar, liberdade de falar, liberdade de agir.
Eu não quero que o governo caia! Quero que o regime mude! Para que ninguém possa dizer, conformado, “Atrás deste vem outro igual ou pior”!

By me

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