terça-feira, 24 de abril de 2012

Trovas genealógicas




Trovas genealógicas


"Minha avó era uma pulga
minha mãe era um sardão.
Sou neto dum corno velho
(não há pulga sem senão).

Refrão:
Nascemos intempestivos
dum coito de ideias tolas
estamos vivos estamos vivos
fomos feitos em ceroulas.

Arre lagarto lagarto
lagarta da geração
mais vale morrer de parto
que nascer de inspiração.

Refrão:
Nascemos intempestivos
duma réstia de cebolas
estamos vivos estamos vivos
fomos feitos em ceroulas.

De sete primos que tinha
quatro são peixes da horta
dois peixes da ribeirinha
e um peixe de retorta.

Peixe-espada peixe-cama
avó pescada do alto
titicaca citirama
paisagem de pó de talco.

Refrão:
Nascemos intempestivos
do rolo das pianolas
estamos vivos estamos vivos
fomos feitos em ceroulas

Jesu jesu que não posso
dar passada no passado
sem que tropece no osso
de algum avô desusado.

Ossos que dançam o tango
caveiras valsificadas
orangonassaugotango
esgotado de almas panadas.

Refrão:
Nascemos intempestivos
do tango das castanholas
estamos vivos estamos vivos
fomos feitos em ceroulas

Tíbias perónias famílias
rotuladas titulares
chi de burro chá de tília
esqueletos protocolares.

Sentimentos sedimentos
sacramentos sedativos
alimentos excrementos
mas nunca preservativos.

Refrão:
Nascemos intempestivos
duma união de santolas
estamos vivos estamos vivos
fomos feitos em ceroulas.

Jesu jesu que pecado
impedir a criancinha
de passar um mau bocado
quando sair da bainha
Jesu jesu que pecado
pôr o ovo na sentina.

Final:
Nascemos rebarbativos
dum coito de ideias tolas
estamos vivos estamos vivos
fomos feitos em ceroulas.

Nascemos intempestades
dum parto de ideias falsas.
Somos homens na verdade
assim o provam as calças."


Poema de José Carlos Ary dos Santos

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