terça-feira, 6 de setembro de 2011

Quase a preto e branco



O que tem muita graça no ser humano é que, e ao invés do que geralmente se pensa, ele não evolui com a idade. Regride!
O Homem, enquanto adulto, passa o tempo a socializar, a equilibrar as vivências, a encontrar explicações, a contemporizar, a argumentar. Mais ainda, esta sua capacidade vem de muito longe, cultivada desde tempos imemoriais.
Mas, com isso, não apenas perde a sua inocência infanto-juvenil como perde a capacidade de apreciar as coisas como elas realmente são. Abstrai-se dos prazeres, desconta os desprazeres e vive numa modorra infernal em que nada realmente é mas tão só é relativizado. Cinzento! Neutro!
A criança, ao contrário, não relativiza. As coisas são ou não são, gosta ou não gosta, atraem-na ou afastam-na. Na vida da criança não há meios-tons, as coisas são em preto e branco ou cores saturadas, em alto contraste, niveladas pela satisfação das sua necessidades físicas ou intelectuais. As emoções prevalecem por sobre o intelecto!
Por mim, que atingi já mais de meio século de vida, passo o tempo (como todos os outros) a racionalizar, a relativizar, a encontrar explicações e desculpas.
Mas há um pedaço de mim que ficou algures no tempo, que não envelheceu ou amadureceu: creio que, em parte, sou ainda criança. E essa parte de mim, sempre em luta com o resto do “eu”, não quer tal vida: procura tirar partido dos prazeres, excluir das vivências os desprazeres, e transformar a vida em preto e branco ou num arco-íris. Como um petiz.
E, quando as coisas me desagradam, reajo. Protestando, barafustando, dando murro na mesa, tentando afastar de mim aquilo de que não gosto e fazendo o possível para que se não repita.
É nesse meio-termo, entre o protesto infantil e a contemporização adulta que me vou movimentando. E, tendo-o feito ao longo da vida (talvez mais ainda nestes últimos anos), não creio que vá aprender agora outras “maneiras”.
O caso da fotografia usurpada (como muitos outros que tenho vivido) mais não é que uma dessas situações: não gostei e protestei. Como um catraio. A minha parte adulta fez-me usar os meios ao meu alcance para que a situação terminasse: protestando - junto de quem a publicou – e tentar com isso que tal não se repetisse com outros – a divulgação.
Nada teve de “coragem”, já que o risco corrido foi inexistente. Na pior das hipóteses não me responderiam. O que houve foi, antes sim, um inconformismo e uma revolta perante um incómodo.
Deu trabalho? Pouco ou nada! Procurar na web os contactos, usar de algum tempo para escrevinhar umas palavras e a tecnologia fez o resto. Um processo ao alcance de qualquer um, a custo zero e esforço reduzido.
Lamentavelmente, a esmagadora maioria dos seres humanos faz os possíveis por atingir a idade adulta e renegar a infância que ainda pode possuir. E conforma-se, contemporiza, encolhe os ombros e vai dizendo “Podia ser pior!” ou “Com um pouco de sorte, não me torna a acontecer!”
Que pena que não se cumpra aquele desejo, já não sei de quem: nascer num caixão, evoluir para um estádio de trabalho regular, continuar para uma juventude exuberante, aterrar numa infância inocente e morrer num orgasmo de felicidade. A preto e branco, com uns laivos de pôr-do-sol.

Texto e imagem: by me

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