domingo, 7 de novembro de 2010

Mentir



Um destes dias tive que ir testemunhar a tribunal. À entrada na sala de audiências, e depois de me identificar, foi-me dito pela juíza que mentir ali seria considerado crime.
Não o tencionava fazer, pelo que não senti intimidado. Mas também não se tratava de uma ameaça ou intimidação: apenas uma informação.
De facto, mentir num tribunal é algo de muito grave. Para além dos danos que possa causar às partes envolvidas, mentir num tribunal é mentir perante todos os concidadãos, já que a justiça representa o povo ao julgar os actos de acordo com as leis pelo povo definidas.
Em qualquer dos casos, mentir é uma coisa feia. Sabemo-lo desde pequeninos, que isso nos ensinaram e aprendemos. E se não gostamos que nos mintam, não devemos fazê-lo para com os outros, sejam esses outros o nosso interlocutor directo ou toda uma nação.
Por tudo isso não posso deixar de concordar com o que foi dito um destes dias e que bastante celeuma tem criado.
Quem o disse foi alguém com quem não simpatizo: nem com a sua figura, nem com os seus discursos, nem com o ideal de sociedade que representa, junto com os seus correligionários. Refiro-me a Pedro Passos Coelho, que defendeu a responsabilização civil e criminal para quem não cumpra os objectivos da governação.
Tenho que o aplaudir! Este conceito é algo que todos defendem menos, naturalmente, os que estão ligados à vida política, que dela fazem o seu ofício. Pois que não faz sentido que qualquer cidadão que não cumpra com os compromissos assumidos possa ser julgado em tribunal por incumprimento ou mentira e que aqueles que são escolhidos para executar uma função governativa (seja qual for o nível de poder, da autarquia à presidência da república) possam executar as suas funções com a qualidade e empenho que entende e, em terminando o mandato, seguir a sua vida como se nada tivesse acontecido.
Aqueles que mentem no exercício do seu mandato ou em campanha eleitoral deveriam ser responsabilizados da mesma forma que qualquer outro cidadão. Mais grave que apenas o mentir são as consequências dessas mentiras ou do mau desempenho, já que afectam, e profundamente, milhões de cidadãos.
Claro está que, na sequência de tais afirmações, vieram os políticos e os teóricos a terreiro defender que esta é uma ideia absurda, que não tem cabimento em democracia, que os julgamentos civis ou criminais não se aplicam ao desempenho de funções governativas ou políticas. Não admira este tipo de reacções: estão a defender a sua própria classe e posição. Se, por cada mentira ou má decisão governamental fosse aberto um processo judicial, teriam que abrir novos tribunais, que os existentes não chegavam. Que mentir inconsequentemente faz parte da actividade política. Aliás, sempre gostaria de saber que atitude teria este senhor se, estando ele em funções governativas, alguém propusesse o mesmo. Acredito que faria coro com os hoje o contestam.
A inconsequência pessoal das decisões de governantes e políticos, bem como a inconsequência pessoal das suas afirmações, é um dos aspectos que mais me desagrada da organização social que temos. Por cá, neste jardim à beira-mar plantado e mal amanhado, e no resto da sociedade dita ocidental.
Nunca será cedo demais uma alteração radical nesta questão! Seja qual for o “-ismo” que usemos para a classificar!


Texto e imagem: by me

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