quarta-feira, 10 de novembro de 2010

E pronto: assim se faz uma notícia



Foi detectada e desmantelada uma rede de prostituição. Confesso que não sei qual o espanto ou a relevância desta notícia, a menos que seja por, por uma vez, isso acontecer.
É que quem quiser ver as prostitutas a aliciarem os clientes, bem como os seus protectores (vulgo chulos) mais não tem que ir às zonas habituais e olhar em redor. Elas estão ali, de dia ou de noite, exibindo-se como artigo em montra. Eles, mais discretos, parecem ver detalhadamente as montras das drogarias ou lerem “ad aeternun” as páginas dos jornais, desportivos ou outros.
Aliás, recordo ter feito em tempos um trabalho de regularidade semanal, em que era nosso divertimento vê-las chegar pela tardinha, juntarem-se e embarcarem em carrinhas que as iriam transportar, ao que constava, para pontos estratégicos ao longo de estradas nas imediações da capital.
E se esta profissão, a de prostituta, é “a mais velha do mundo”, a deles será, talvez, a segunda ou terceira. Pelo que não deverá haver segredos ou truques especiais no seu exercício.
Assim, não entendo porque é notícia o desmantelar de uma rede. A menos que as polícias só lhes prestem atenção uma vez por ano, ou nem tanto. Ou então…
Ou então porque usam as novas tecnologias para divulgarem os seus serviços (o que já vem acontecendo, faz muito, em alguns jornais diários), e porque um dos eventuais promotores é repórter.
Isso mesmo! Um dos supostos promotores é repórter na RTP. E é isso que é a notícia! Não o haver prostitutas, não o haver proxenetas, não o terem desmantelado a rede, mas sim o estar envolvido alguém dos média e uma empresa que serve de “bombo da festa” em qualquer ocasião.
Acrescenta a notícia que a RTP não comenta o caso. E que a Comissão da Carteira Profissional de Jornalistas vai averiguar alguma eventual quebra do dever profissional.
Pois é! Putas e chulos tudo bem! Agora que isso macule a reputação dos média, isso é que não! E com mutismo ou com investigações, há que manter tudo e todas com as reputações intactas.
Mas a notícia vai ainda mais longe: não tendo sido confirmado pelo jornal que li, terá sido encontrada uma lista de clientes desta rede onde estarão incluídos políticos, juízes e um alto quadro da televisão pública.
E pronto. A notícia não é o haver putas e chulos; não é o terem desmantelado uma rede on-line de prostituição. Para além de gente ligada aos média, é haver gente “acima de qualquer suspeita” clientes desta rede. Como se políticos e juízes não pudessem ser clientes da profissão mais velha do mundo. Como se isso fosse desvirtuar as suas qualidades, supondo que as têm. Esperemos por uma fuga de informação sobre esta lista, algures na web.
Claro que é de reparar que, se no caso do repórter, as entidades a ele ligadas foram questionadas, no caso dos clientes VIP, nem partidos nem justiça foram abordadas.

Pergunto-me se nesta rede agora desmantelada não constasse gente ligada à comunicação social, à política e à justiça, se seria o caso tão abundantemente divulgado. Talvez que não fosse notícia, para além de um breve parágrafo na secção de crimes.
Ora batatas para os critérios editoriais!

Texto: by me
Imagem: edit by me

(Propositadamente, este texto foi escrito à revelia do novo acordo ortográfico)

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