quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Só uma pontinha


O final do mês é, para a maioria dos residentes neste país, uma altura penosa. Já não se vive de dinheiro mas tão só de moedas contadas e de despesas controladas para além do limite. É que, e ao contrário do que os nossos governantes querem fazer crer, o cinto está apertado faz muito e as vacas já só consultam o dermatologista e o ortopedista, de magras que estão.
Assim, quando surge algo vindo do nada, um extra inesperado e a custo zero, é certamente uma alegria. Nalguns casos, verdadeiros momentos de felicidade.

Um domingo houve foi bastante profícuo no que a fotografias diz respeito. Se o início da tarde foi fraco, aparentando ser mau presságio, o fim da tarde rendeu como nunca. A ponto de esgotar a reserva de papel e de não poder atender as últimas solicitações.
No início da enchente, duas senhoras e uma criança posaram para o retrato. Ficaram satisfeitas com o resultado, só lamentaram ser apenas uma cópia. Quem iria ficar com esta? Se bem me recordo, tratava-se de duas irmãs e do filho de uma delas. Bem que quiseram que eu imprimisse uma segunda cópia, mas algo no meu instinto me fez recusar, nem pagando. Creio que, intimamente, antecipava a enchente que viria ao final da tarde.
Mas a tristeza das senhoras foi tal e tão visível que acabei por lhes prometer que, se voltassem durante a semana e me encontrassem, eu teria uma outra cópia para lhes dar. Tomei nota do caso e pedi-lhes que não o divulgassem, que era uma quebra séria na rotina instituída.
Em chegando a casa, ao processar as imagens e dados, lá estava a anotação e tratei de a imprimir e guardar onde sabia que me acompanharia nas idas ao jardim da Estrela.
Acabaram por surgir, tia e sobrinho. Não os vi chegar, que vieram das minhas costas, mas quando nos encarámos, e após as saudações (pimpolho incluído), a pergunta foi imediata:

“Tem aí alguma coisa para nós? Lembrou-se?”

O seu olhar dizia-me que não supunha que me tivesse recordado, mas lá no fundo, meio escondida, uma centelha de esperança brilhava.
Quando rebusquei os suportes de plástico do mostruário onde a tinha guardado e a retirei, protegida por um papel, o sorriso com que me brindou foi impagável! Não apenas me tinha lembrado como tinha cumprido a promessa!

Por vezes, não damos o real valor que uma fotografia pode ter para quem nela está representado.
Não creio que venha a ter nova oportunidade de conversar com esta senhora, passante ocasional que é. E enquanto ali esteve, o pirralho não deu azo a conversas mais demoradas. Mas sempre me questiono sobre quantas fotografias das duas irmãs com a criança existirão naquela família. Ou mesmo, quantas fotos das duas irmãs juntas!
Por vezes, basta só um niquinho, uma pontinha de nada de luz, para fazer a diferença e provocar uns momentos de felicidade!


Texto e imagem: by me

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