quinta-feira, 30 de setembro de 2010

O relógio

Sabemos que os publicitários são especialistas em comunicação e que não dão ponto sem nó.
Cada elemento constante numa campanha, vídeo, fotográfica, na imprensa ou na rua, tem códigos bem definidos em função do público a que se destina, tentando maximizar o impacto da mensagem e fazer gravar na memória a marca e o que a ela estará associado.
Neste cartaz de publicidade a uma marca de relógios, o que aqui mostro é só parte dele. A parte que não consegui interpretar por completo e que me deixou a pensar na coisa.
Consigo entender que tenham escolhido por hora as 10.10h. Equilíbrio, simetria, harmonia… ainda que eu tivesse preferido, neste caso, 02.50h., que o maior tamanho do ponteiro dos minutos ficaria equilibrado pela mancha do calendário.
Também entendo o ponteiro dos segundos na posição zero ou doze. Rigor, precisão, fidelidade…
Chego igualmente a alguma conclusão, ainda que mais rebuscada, com a escolha de “wed”, quarta-feira. Ao fim e ao cabo, é o dia do meio da semana, equidistante do fim-de-semana que foi e do que há-de vir.
Só não consigo entender porque raio foram escolher o dia 29. A única explicação que encontro é o último dia de Fevereiro num ano bissexto, um dia raro, de 4 em 4 anos. Uma relação dessa raridade com o relógio mostrado? Ou antes uma piada subtil do publicitário, não confessada ao cliente, de estes relógios serem de curta vida, uns quatro anos no máximo?

Ficarei na dúvida, que ter dúvidas pode ser bem divertido!

Texto e imagem: by me

O passeio público

Acredito que os especialistas em comportamento humano (supondo que esta especialidade existe) saibam dar uma explicação.
Certo é que não me recordo de uma vez em que tenha estado neste local por mais de uma hora sem que tenha assistido ao que aqui se vê, neste ou noutro grau: manifestação de afecto.
Entre crianças, entre adolescentes, entre adultos, entre idosos, no cruzamento de qualquer um destes grupos, certo é que, aqui, as pessoas se beijam fraterna ou apaixonadamente.
O local nem sequer será, digo eu, o mais propício a tal: um passeio largo, na berma de uma artéria com bastante movimento, onde a intimidade ou privacidade é difícil de encontrar. Mais ainda: do outro lado da via encontra-se uma igreja, que sabemos não ser muito permissiva ao que aqui se vê. E, nas costas do fotógrafo, uma esplanada muito concorrida, onde, pela certa, algum conhecido destes ou de quaisquer outros dois poderiam testemunhar o acto.
Mas certo é que aqui, enfim, mais ou menos uns vinte ou trinta metros, é facílimo de assistir a situações destas.
Para quem se sentir mais em baixo, menos de bem com o mundo ou com menos fé nos Homens, sugiro que venha até aqui, à estrada de Benfica, junto à igreja, no largo fronteiro ao café Nilo, e por aqui se deixe ficar, na esplanada ou nos parcos e concorridos bancos de madeira que a autarquia instalou.
Acredito que, em passando uma hora ou semelhante, daqui saia com um pouquinho da felicidade e afectos a que poderá assistir.
Assim como que ir a banhos no passeio público.

Texto e imagem: by me

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Um dia, quem sabe?...


Texto lido em TVI 24, 28/09/2010

Islândia: primeiro-ministro processado por causa da crise
Vai ser criado um tribunal especial para julgar Geir Haarde por negligência

O parlamento islandês decidiu julgar, num tribunal especial, o ex-primeiro-ministro, que estava em funções quando o país faliu. Segundo a agência «France Press», Geir Haarde será acusado de «negligência» no processo que culminou com o crash do sistema financeiro do país em Outubro de 2008.
A decisão foi alvo de votação e aprovada por uma curta margem de 33 votos a favor e 30 contra.
Geir Haarde, de 59 anos, tinha chegado ao poder em 2006 e foi reeleito em 2007. Renunciou em Janeiro de 2009, por sofrer de um cancro.
Segundo várias sondagens, a maioria dos islandeses defende que Geir Haarde e vários ex-ministros sejam julgados pelo seu papel na crise que assolou o país, nomeadamente por nacionalizarem «de urgência» os principais bancos do país que tinham falido.

Opções policiais

Em chegando ao principal largo do meu bairro, tudo parecia estar como de costume: a estação de comboios no mesmo sitio, o centro comercial também, o quiosque continuava a vender revistas e tabaco, os passeios mantinham-se ocupados por automóveis…
A única nota dissonante era uma patrulha apeada de três membros da divisão de trânsito da PSP. Bem visíveis à distância, que a sua braçadeira vermelha não dá azo a confusões.
Estavam eles (dois homens e uma mulher) olhando pacatamente o que ali se passava e foram-se dirigindo para os meus lados, que parara eu no cruzamento das duas ruas da imagem.
Esperei que se aproximassem quanto bastasse e interpelei-os sobre se iriam actuar em relação aos passeios ocupados.
Responderam-me que sim que talvez, mas que primeiro haveriam de tratar destes outros, estacionados também à margem do código da estrada, mas na faixa de rodagem.
Então eu espero, disse-lhes, vou ali ao Multibanco e volto. É que, sabem, faço questão de fazer valer os meus direitos como peão e sempre gostaria de vos ver aplicar a lei.
“Vá”, disse-me ela em tom irónico, “e aproveite e tome um ou dois cafés, que isto vai demorar muito!”
Fui, voltei, esperei, fui tomar um café, voltei, continuei a esperar e, hora e meia depois, estavam todos os estacionados na faixa de rodagem multados, alguns com os condutores identificados.
Entretanto, e porque a presença deles ali, bem como o que estavam a fazer, já tinha sido divulgada por tudo quanto era lugar nas imediações, todos os carros que estavam no passeio haviam partido, dando lugar a um passeio largo, bonito de se ver, e seguro para quem nele quisesse caminhar.
Fui-me embora, que nada mais havia ali para eu ver. Já na estação, do outro lado do largo, ainda vi a agente que me havia recomendado dois cafés, na zona do passeio, a olhar para ele e para mim, encolhendo os ombros.

Claro que, tendo que definir prioridades, o estacionamento irregular no asfalto é bem mais importante que a segurança dos peões.
Resta saber se é uma opção dos agentes de segurança, se uma decisão dos seus comandos ou se depende da importância das coimas aplicadas.

Texto e imagem: by me

Ao acaso

Estendi a mão para a estante e tirei um livro ao calhas.
Abri-o algures sem escolher e apontei o dedo.
Saiu-me isto:

“The effectiviness of photography’s statement of lost depends on its steadily enlarging the familiar iconography of mystery, mortality, transcience.”

In “on photography”, by Susan Sontag

Porque me tornou a dar na bolha


By me

Limites

Disse alguém, por estes espaços e faz algum tempo, que “Não se pode matar um leão por dia”!
Nada mais verdadeiro!

A questão põe-se, no entanto, quando eles são tantos, ou nós vemos tantos, que somos empurrados contra a parede. Confrontados com leões de um lado (nem é forçoso que eles existam, mas basta que os sintamos) e uma parede sólida e cinzenta do outro, as alternativas são reduzidas:
Ou bem que os continuamos a enfrentar, até que nos faltem as forças;
Ou bem que tentamos subir por uma parede onde não nos podemos agarrar;
Ou bem que nos deixamos ficar, submergidos por garras e presas ou pelos escombros da parede que somos nós mesmos.
Resta-nos ainda a atitude do escorpião, mas creio que essa é o desespero final!

Com um pouco de sorte e, talvez, com um Gurosan pelo caminho, lá nos levantaremos de novo e, de espada, de pena ou de objectiva, lá continuaremos a matar leões.
Até lá, tentaremos apenas rugir ao desafio, procurando manter aquele espaço vital que nos mantém do lado de cá da sanidade.


Texto e imagem: by me

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Pequenas preciosidades

Esta imagem poderia ter sido feita numa qualquer vila ou mesmo cidadezinha deste país.
Casas de piso térreo, com o beiral do telhado decorado singelamente, a roupa a secar ao sol, sem medos ou pudores, o asfalto que não chegou ao fim do arruamento, um poste de madeira…
Mas não! Esta imagem foi feita na Rua do Açougue, ali mesmo em Benfica.
Claro que estas edificações de fachadas mais ou menos arranjadas, têm as traseiras em péssimo estado, deixando mesmo perceber em quão mau estado estão os telhados. E, com eles, a restante estrutura.
Claro, também, que estas edificações, todo este quarteirão, terá os dias contados, que o centímetro quadrado nesta zona da cidade vale fortunas nas mãos dos construtores civis.
Teremos que ser nós, cidadãos, a decidir se queremos que estes vestígios da cidade se mantenham ou que sejam engolidos por megatérios, como os que se encontram a escassas dezenas de metros das costas deste fotógrafo e nesta data.

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Um olhar - talvez Maria, a Estudante

Atravessou a rua, deixando para trás os seus amiguinhos, direita a mim.
- Olhe, dava-me um cigarro?
Olhei para a sua juventude e, segurando a câmara na mão esquerda e o cigarro acesso na direita, perguntei-lhe:
- E já tens idade para fumar?
- Faço dezassete anos para o mês que vem! – respondeu-me, não sei se mentindo se não.
Olhei-a de alto a baixo, dei-lhe o benefício da dúvida e atirei-lhe:
- Troco! Um cigarro por uma fotografia dos teus olhos!
Riu-se. Um riso que ficava algures entre a surpresa e o nervosismo.
- Uma fotografia dos meus olhos? Uhhhhh…. Pode ser!
Dei-lhe o cigarro, posicionei-a na melhor luz, olhei para câmara, afinei-a e, quando levantei os olhos, quase que tive que lutar para fazer o que aqui se vê. Os seus amigos tinham atravessado a rua e, p’la fé de quem eram, haveriam de ficar na fotografia também.
Mas não! O negócio tinha sido com ela e apenas dela haveria de guardar o olhar.
O que não guardei foi o seu nome, que no meio da confusão que se gerou nem tive oportunidade de o inquirir. Talvez seja Maria, a Estudante.

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Dog's place

Nas zonas suburbanas, já nem a verticalidade é arbórea nem o verde é clorofila.
E já nem atrás de um chaparro é o local certo para canídeos ou humanos fazerem aquilo que sempre fizeram, pouco tempo depois da primeira refeição de todos os tempos.

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Porque me deu na bolha...

… logo de manhã, em regressando do primeiro cafezinho do dia.


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segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Um detalhe

Em frente a uma escola


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Não é todos os dias

Vinha cansado.
O dia correra-me mal, com um conjunto de coisas que deram para o torto e uma sensação de vazio. Não apenas não conseguira fazer o que queria como o que não esperava avariou, redundando em inundação doméstica. E, em sendo fim-de-semana, nenhuma solução no próprio dia.
Assim, atravessei meia cidade em busca de um restaurante: não teria que cozinhar nem lavar loiça, nem sequer que pensar no que ingeria, que esta é a vantagem dos franshising de restauração – todos iguais.
Mas precisava de um objecto em particular para ilustrar o sentimento de vazio: um balão. E, da imensidade de tralha inútil que tenho por casa, este não é um item que conste.
Foi assim que entrei numa loja de artigos festivos, ilusionismo e circenses, em busca de um balão. Bastava-me um, ainda que meia-dúzia não fossem demais. Sempre ficariam na caixa de inutilidades desarrumada na dispensa doméstica.
No entanto, que horror! Pendurados no expositor, apenas sacos de cem balões. Para que quero eu uma centena de balões?!
E expus a questão ao jovem vendedor: Basta-me um, um só! E foi aqui que ganhei o dia!
Perguntando-me ele se só queria mesmo um e se seria de encher apenas ou de modelar, dirigiu-se a uma embalagem e, com as artes mágicas próprias da loja, retirou um sem a abrir. Entregou-mo e, com um sorriso, afirmou “Oferta da casa!”
Não sei se seria o meu ar de cansado, com as minhas longas barbas brancas e a minha pesada mochila num dos ombros. Não sei se pelo incomum do pedido. Não sei se seria um dia especial para ele. Mas a verdade é que, num centro comercial, numa loja de inutilidades e futilidades, me ofertaram um artigo em venda. Sem lucros ou mais-valias! Sem nada em troca que não fosse um sorriso!
O balão veio vazio, mas eu voltei a encher-me de fé nos homens. E, no lugar de ilustrar um artigo de frustração e neura, aqui fica num outro de positivismo e esperança.
Porque não sei quem terá ficado mais satisfeito com este pequeno episódio: se eu que o vivi, se ele por o ter provocado!


Texto e imagem: by me

Tu, Você, V. Exª

O tempo é dividido em diversas unidades: anos, luas, horas, segundos, milénios…
Profissionalmente, o meu divide-se em 1/25 do segundo. É quanto dura cada imagem que transmito.
25 imagens por segundo! 1500 imagens por minuto! 90.000 imagens por hora!
Este é o meu ritmo de trabalho.
Com esta quantidade de opções por unidade de tempo, não tenho grande oportunidade de me preocupar com formalidades e graus de tratamentos inter-pessoais.
Divido os meus relacionamentos em dois grupos: os companheiros de trabalho, seja qual for a sua função ou idades e os convidados, externos à empresa, que temos em frente das câmaras.
Para com os primeiros, tenho um tratamento por “tu”. Igualitário! Fraternal! Indiferenciado! Seja qual for a sua posição na enorme pirâmide hierárquica que por lá existe.
Para com os convidados tenho um tratamento na terceira pessoa, por “você. Entram como convidados, saem como conhecidos, mas são convidados, a quem há que tratar com a deferência que alguma cerimónia impõe.
Há ainda uma terceira abordagem: o tratamento por “você” para com as pessoas com quero assumidamente ter uma tratamento à distância, com quem não quero ter intimidades. Se levar as coisas ao limite e quiser ser mesmo insultuoso, tratarei por “Vossa Excelência”.
Goste-se ou não, nascemos da mesma forma e acabaremos do mesmo jeito. E não tenho tempo nem paciência para discriminações de idade, posto laboral, categoria social ou classificação honorífica.


Texto e imagem: by me

domingo, 26 de setembro de 2010

Queimei-me

Acontece ao mais pintado:
A fritar um ovo, saltou-me um pingo de azeite – quente! – para a mão e queimei-me.
Não vou aqui dizer o que então proferi, que isto aqui é para todas as idades e sensibilidades, mas estou em crer que os meus vizinhos ficaram a saber da riqueza do meu vocabulário.
Tendo conseguido não deixar cair a frigideira, pousei-a e corri para a farmácia doméstica, onde se guardam não só as sobras dos medicamentos mas também aqueles outros para as urgências, em busca da pomada que miraculosamente me iria aliviar. Não tinha!
Há uns meses, numa aflição semelhante de um vizinho, havia lhe emprestado a minha bisnaga e não tinha feito a recarga.
Felizmente, desta vez havia sido apenas um pinguito e a coisa passou, mais ou menos. Mas ficou-me na ideia que haveria de comprar outra, não se vá dar o caso de a queimadura ser bem maior e profunda. O que tratei de fazer aquando da minha passagem pelo super cá do burgo, que tem uma parafarmácia, daquelas que vendem de tudo, desde que não exijam receita médica.
Ao balcão, pedi por uma de duas marcas: Queimax, na imagem, ou Apirol. Não sou especialista na matéria, farmacêutica ou quejanda, mas estas duas estão na minha memória desde sempre, assim como Aspirina, se bem que neste caso, o ácido acetilsalicilico se use com outro nome e apresentação, cá em casa.
Ao balcão, a parafarmacêutica disse-me que só tinham esta, mas querendo ajudar e fazer o seu papel, sempre me perguntou para que efeito era. E lá lhe expliquei: queimaduras em geral, de azeite em particular, que me tinha dado muito jeito. Olhando ela para a embalagem, disse-me com ar sabedor:
“Ah sim, esta tem água purificada, pelo que serve perfeitamente.”
Paguei, recusei o saco de plástico como habitualmente, e guardei no bolso. Mas guardei também a informação da “água purificada”. Que raio de importância isso teria para queimaduras?
Em casa fui ver e constatei o que se lê (eu ajudo que as letras são pequeninas): Sulfato de hidroxiquinoleina e potássio– 0,2%; Cânfora – 0,3%; Excipientes: Goma de Alfarroba e Água Purificada.
Fiquei assim a saber que o tal ingrediente milagroso afinal pouca importância terá. O que de facto conta são aqueles, somados, 0,5%. Mas também fiquei a saber para que serve aquilo que enchia sacas que ajudei a carregar quando catraio, a Alfarroba, que o meu avô tinha umas quantas alfarrobeiras.
Sabia eu que ele guardava metade do que colhia para alimentar a sua burra, Catita de seu nome, e que vendia o resto para uma cooperativa agrícola a que estava associado. E nunca me passou pela cabeça que servisse para tal.
O que posso também assegurar é que, provada no seu estado natural, a Alfarroba sabe mal que se farta. Mas garanto que a Alfarrobeira proporciona esplêndidas sombras quando o calor aperta e se quer dormir uma bela de uma sesta.
Para quem quiser saber mais sobre os usos da Alfarrouba, aqui fica um link: AQUI


Texto e imagem: by me

Matemática social

“Carrego a merda que os outros fazem!”
Foi assim que ele se descreveu e ao seu ofício. O nome oficial será “Cantoneiro Municipal” e, em tempos, chamávamos-lhes “Almeidas”, ainda que eu não saiba porquê. A abordagem inicial foi a costumeira: Querer saber se num outro dia poderia vir para eu lhe “tirar o retrato”. É a atitude habitual de quem quer saber detalhes mas não tem a coragem de perguntar quanto custa, por não ter dinheiro para o pagar.
Em sabendo-o grátis não o acreditou mas, perante a minha insistência no preço, quis fazer uma. Estou convencido que estaria na disposição de pagar no final, ainda que não soubesse o valor e correndo o risco de ser demasiado para ele. É que o seu espanto e gratidão quando, no fim e depois de a receber, constatou que era mesmo a custo zero, foi sincero. Até a forma de o demonstrar.
Para além das expressões e gestos usados, foi a oferta de um copo de tinto, pago no tasco vizinho de sua casa, nas imediações do pátio onde reside, ali na vizinhança. E a firmeza com que me apertou a mão e, muito estranhamente, a levou aos dois lados da sua cabeça, não me permitem duvidar que, em lá indo, terei um copo à minha espera.
É particularmente curioso constatar que são quem tem proventos mais modestos, quiçá nenhuns, alguns mesmo a “carregar a merda que os outros fazem”, que mais insistem em pagar a fotografia recebida, que mais genuinamente ficam agradecidos por ela e em quem se vê um sorriso mais sincero.
Talvez porque, em regra, a solidariedade é inversamente proporcional ao nível económico!


Texto e imagem: by me

sábado, 25 de setembro de 2010

Hair -- Let the sun shine in

Dantes....

Dantes…
Bem, dantes, em frente das tascas, vendas, mala-postas, tavernas e até mesmo palacetes, havia postes, argolas, varões, com o mesmo fim: prender os animais.
A ideia seria evitar que fugissem ou que entrassem onde não deveriam.
Hoje… hoje usam-se varões, postes, corrimões, por vezes até puxadores de porta para segurar os lulus, os canitos, até mesmo os Doberman, os Mastins e outros, com o mesmo fito.
Mas duas coisas não se conseguiram ou conseguem evitar: que os animais que ali estão façam ali mesmo o que têm que fazer; que estejam presos.
Quanto a nós, no lugar de coleira ou arreio, usamos correias de relógio, códigos vários e até pesadelos. Mas estamos igualmente presos até que quebremos ou roamos a trela.
Que livre não estar-se: é ser-se!

Texto e imagem: by me

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Deu-me na telha


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O jornalismo piorou com o aparecimento da Internet


E não sabíamos já isso?!
“O jornalismo piorou com o aparecimento da Internet” - Media - PUBLICO.PT

Jornalismo e dinheiro

Este é um texto retirado do Diário de Notícias em 2004 e assinado por Sérgio Barreto Motta.
A minha questão é simples: como teremos alguma vez a certeza de esta estória não continua a repetir-se, com outros protagonistas, no Brasil ou em Portugal?

Em 1993, a principal revista semanal brasileira, Veja, publicou uma reportagem que desmoralizou o então Presidente da Câmara dos Deputados, Ibsen Pinheiro. Com o título “Até tu, Ibsen”, a reportagem acusava o deputado de haver movimentado, ilicitamente, um milhão de dólares no exterior. À época, o nome de Ibsen era citado como possível candidato à presidência da República.
No entanto, segundo uma carta do jornalista responsável pela denúncia, Luís Costa Pinto, pouco antes do fecho da edição o próprio jornalista descobriu o erro que cometera: a quantia movimentada não era um milhão de dólares mas os inexpressivos mil dólares. Segundo o depoimento de Costa Pinto, agora publicado pela concorrente “Isto é”, a “Veja” decidiu não mudar a reportagem e, em vez disso, foi buscar depoimentos que corroborassem a denúncia. A “Veja” desvalorizou o facto de poder prejudicar a imagem da vítima, concentrando as suas preocupações em não ter prejuízo com a suspensão da distribuição, pois a revista já estava impressa.
De acordo com Costa Pinto, o então director executivo da empresa, Paulo Moreira Leite, alegou que alterar a capa já impressa teria um grande custo e, assim, o melhor seria seguir em frente. A “Veja” publicou então a matéria desajustada da realidade, que fulminou a carreira de um expressivo deputado. A revista tinha uma tiragem de 1,2 milhões de exemplares.


Texto inicial e imagem: by me

Soluções

Eis uma escada de emergência.
Construída no topo sul de um edifício de uma empresa, está construída de tal forma que, em caso de incêndio, quem a descer estará a salvo das chamas que possam consumir o prédio e o seu interior.
A sua instalação não é de raiz mas, tal como as paredes de betão que a circundam, muitos anos mais nova que a edificação original. Para cumprir as regras de segurança.
Claro que acaba por ser também usada por quem lá trabalha para vir fumar um cigarrito ou aceder mais rapidamente a um outro piso ou à cantina. E todos esperam que nunca seja usada para evacuações a sério.
Claro está que as restrições orçamentais obrigaram, aquando da sua construção, a usar ferro na estrutura e degraus: mais barato, mais leve e com menos alicerces que se fosse feita em alvenaria.
Claro que as senhoras, com os seus sapatos de salto alto, tê-los-ão partido ou mesmo torcido tornozelos, que os buracos dos degraus ainda são grandes.
Solução fácil, para obstar a acidentes de trabalho, foi a proibição dos tais sapatos de salto alto e fininho. Quem quiser beleza que use outros acessos!
Pergunto-me, no entanto, o que estarão à espera que aconteça no dia ou noite em que estas escadas tiverem que ser usadas para o seu destino original: emergência. Tirarão as senhoras os seus sapatos bonitos e na moda, correndo o risco de cortar seriamente os pé no ferro dos degraus?
Suponho que quem optou pela solução da proibição seja homem e que nunca tenha descido esta escada descalço.

O que acaba por ter mesmo graça é que só conhecia este sinal de proibição em embarcações de recreio, de fibra ou madeira, onde os saltos, bem como os pregos dos tacões clássicos, danificam o verniz do convés.


Texto e imagem: by me

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Um olhar - Patrícia


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Uma prenda


Não tem muito que saber: é Portugal!
Dou uma volta pelo Centro Comercial do meu bairro. O passeio é meio inútil e eu sei-o. Não irei lá comprar nada, para além da dose de cafeína. Mas busco uma ideia para uma prenda de aniversário e a variedade de montras pode ajudar.
Não ajudou!

Mas algures no meio, num local estratégico de passagem obrigatória, dou com isto!
Não apenas com isto. O que aqui está é o que encima um manequim vestido com um fato de protecção contra fogos. Dos bombeiros.
Com a minha paragem, observação e cogitação, sou abordado. Por uma das duas garotas, de uns 18 anos cada, vestidas a rigor com a farda dos bombeiros voluntários.
Cordial, pergunta-me se pode ocupar uns minutos do meu tempo e, perante a minha anuência, diz-me estar ali para angariar fundos para a compra de um fato daqueles para a corporação. O conjunto, excepção feita ao capacete, orça os 800 Euros. Bastante dinheiro para um corpo de bombeiros voluntários. Tanto mais que a sua zona de influencia tem vindo a aumentar grandemente, não fora ser a freguesia de Algueirão - Mem Martins a maior em termos eleitorais.
Respondi-lhe que sim, que até sou sócio, e contribuí. Com pouco mais ou menos que tinha destinado para a compra do presente.
Tanto pior para o ofertado, que nem desconfiava das minhas intenções.

Talvez um dia, quem sabe, esta minha não-oferta reverta em seu favor. Espero bem que não!


Texto e imagem: by me

Aqui ao lado


O terreno que deu origem ao meu bairro não está todo edificado.
Felizmente!
Correspondendo a uma área de talvez 15% da Tapada original, tem apenas alguns arruamentos delineados por caminhos aplainados e batidos por maquinaria, mas não alcatroados. Há muitos anos que está assim. Entre eles, que definem quarteirões a construir, sobram terras avulsas, pejadas de ervas, algumas árvores, poucas, e bicharada variada, que vai de borboletas e mosquitos, a melros e pardais, passando por lagartixas e, eventualmente, outros repteis e morcegos. Dos pequenitos, mas já dei com eles. Sendo ainda que os terrenos já foram drenados, já por lá não encontramos nascentes e os respectivos charcos com batráquios, como foi em tempos.
Como a zona não está reservada contra a construção, mas tão só a falta de investimento impede o avanço do betão, não tem havido motivos para que arda, o que a tem poupado nos verões quentes.
Este baldio, que fica nas traseiras de minha casa, é bordejado por uma rua alcatroada, que facilita o acesso à minha, evitando as rotundas que entraram na moda nas urbanizações modernas.
Mas, não estando edificada, não possui as infra-estruturas habituais, como seja iluminação pública.
Uso esta rua como acesso pedonal ao supermercado da zona e quando regresso a casa de táxi, tarde na noite.
Um destes dias, melhor, uma destas noites, disse-me um motorista que isto deveria ser construído, já que assim metia medo. A qualquer momento poderia sair alguém do escuro para um assalto, quer fosse de carro, quer fosse apeado.
A minha resposta fê-lo rir o que restava dos 300 metros de rua ou estrada escura, cortada a meio por uma curva em cotovelo: “Bem, se estão à minha espera, bem podem passar frio!”
Em qualquer dos casos, o seu comentário é bem indicativo de como pensa o comum dos mortais: se o local é solitário, é de ter medo!
Por mim, admito, receio ou medo mesmo tenho-o no meio das pessoas, já que são elas quem, eventualmente, me poderão fazer mal. Agora sozinho, no meio da natureza e na ausência de seres humanos, a única coisa que nos poderá fazer mal seremos nós mesmos com os nossos receios atávicos ou com a incapacidade de ouvirmos o silêncio e a nós mesmos. E se ao bicho-homem citadino retirarem os ruídos das máquinas e os zumbidos das energias, retiram-lhe a base onde, supostamente, se apoia.
Espero, muito sinceramente, que a crise imobiliária se mantenha por algum tempo e que este terreno não seja abarbanhado por escavadoras e betão, permitindo-me, de quando em vez, ver abelhas, ouvir o vento e sentir a luz, bem aqui ao lado de casa.


Texto e imagem: by me

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Simetrias


A simetria é uma invenção do Homem.
Bem que podemos procurar na natureza que raramente damos com exemplares.
No entanto, o Homem é natureza, ainda que faça questão de se considerar um caso à parte.
E honra seja feita a algumas obras simétrica e naturais feitas pelo Homem, que são bonitas de ver.
Praticabilidade não será o forte de Clatrava, mas os seus desenhos e concretizações são casos que merecem ser vistos com atenção.

Texto e imagem: by me

Um olhar - Ana


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Só pela luz, desculpem

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Prependicularidades

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terça-feira, 21 de setembro de 2010

Um olhar - Natália


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Desígnios


Um destes dias o nosso presidente da república, Aníbal Cavaco Silva, afirmou que a educação é o desígnio nacional.
Caramba, como esta afirmação me incomoda! E por duas ordens de razão!
Por um lado, a educação por si só não conduz a coisa nenhuma. Não adianta ter uma formidável educação para depois não ter como a usar. Ou seja, cada vez mais se aposta em educação superior, em cursos vocacionados para serviços e promovidos por universidades de vão de escada e os seus finalistas chegam ao mundo do trabalho não tendo como aplicar aquilo que aprenderam. Mais grave ainda, sendo a sua maioria não vocacionados para a produção de bens, cada vez mais produziremos menos ou, se quiserem, cada vez mais estaremos dependentes daquilo que teremos que ir comprar fora do país se quisermos comer, construir, ler, etc. Teremos um montão de gente formada em turismo, gestão, direito, puericultura, economia, história, filosofia, mas não teremos engenheiros de construção, de electrónica, farmacêuticos, médicos, agrónomos, químicos, veterinários… gente cujos conhecimentos permitiriam que a agricultura, as fábricas, a produção animal funcionasse. Donde, para quê apostar na educação, ou fazer dela um desígnio nacional, se o seu resultado mais empobrecerá que enriquecerá o país?
Mas eu diria mais: esse insistir na educação, preferencialmente superior, é um disparate absoluto!
Nem todos os jovens têm capacidade de entender ou aprender abstracções. E boa parte do ensino superior passa por abstracções. O que acaba por resultar em que aqueles que não conseguirem singrar nesse tipo de educação, mas sendo que é ela considerada a ideal, serão pessoas frustradas, com a auto-estima bem por baixo, já que acabam por se considerar (ou serem consideradas) como pessoas de segunda categoria, rotuladas de incapazes, roídas de inveja para com aqueles que, nada tendo feito para isso, conseguem completar tais cursos.
Indo mais longe ainda, eu diria que a educação só por si, sem comida na mesa, sem um tecto por cima da cabeça, sem acesso à saúde e à justiça, sem uma sociedade equilibrada e em paz, é completamente inútil. Cada um destes factores, bem como outros, são os constituintes para a felicidade. E esta sim, será o desígnio nacional: que os seus cidadãos sejam felizes!
E a felicidade não passa, em exclusivo, pela satisfação das necessidades básicas ao ser animal que somos. Passa por estarmos de bem com a vida e com os outros, passa por podermos fazer aquilo que nos dá prazer e não apenas o que nos dá dinheiro. E isto não depende da educação formal ou académica.

Mas o discurso do nosso presidente incomoda-me, e muito, por um outro motivo: o uso do termo e conceito de educação.
O conceito de educar ou ser educado implica a aplicação sobre o educando de formas e conceitos definidos pelos educadores. Com os métodos dos educadores. Com conteúdos balizados pelos educadores. E, no final da educação, teremos educandos que mais não são que a continuação dos educadores, gente que, no lugar de procurar novos rumos, ideias, soluções, se mantém arreigada à educação que lhe foi dada, imposta.
O avanço da sociedade, seja qual for o seu rumo mas passando pela felicidade dos seus elementos, passa forçosamente pela capacidade inovar, de conceber novos horizontes para si e os seus e aproveitar o passado para não cometer os mesmos erros. Passa mais por aprender que por ser educado.
O sistema educativo (e não de aprendizagem) que temos, porque padronizado, porque formatado em objectivos de competência adquiridas iguais às dos educadores e subordinadas a estatísticas nacionais, pouca margem de manobra deixa a que os educandos definam os seus próprios rumos e aprendam o que desejam de entre os conhecimentos que lhes podem ser postos à disposição.

Senhor Aníbal Cavaco Silva: parece que o senhor é um especialista em economia (ainda que eu não o tenha ainda constatado). Mas não queira o senhor impor aos seus concidadãos a sua própria forma de ver o mundo e deixe que, a par com as questões materiais, possam os portugueses encontrar a sua satisfação pessoal, condições básicas à felicidade.
E se o senhor não entende que a felicidade de cada um e de todos é, isso sim, o desígnio nacional, então o senhor está a ocupar um cargo para o qual não está habilitado.

Texto e imagem: by me

Travessa?


Travessa????????
Então mas não é o país??


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Um instante


Num momento de lucidez, apercebendo-se da futilidade do medir o que não tem fim, deixou cair os braços e quedou-se por ali, sorrindo a quem passa e deixando à imaginação de cada um o aquilatar do tempo.


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Já demos!

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segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Ser bonito


Ser bonito, ou feio, não é uma característica intrínseca do que quer que seja: gestos, pessoas, objectos.
Depende, antes sim, de quem vê, dos conceitos que tem e da interpretação do que vê ou analisa.
Dirão alguns que este prédio é feio. O revestimento, se bem que prático e, em tempos, na moda dos construtores civis, não será aquilo que os estetas chamarão de belo. A uniformidade com que a parede está rasgada por aquilo a que damos o nome de janela é também algo que só o Homem produz: a natureza não quer nada com simetrias e regularidades. Também, dirão alguns, não é bonito exibir (ou ver) a roupa a secar ao sol, quantas vezes roupa que mais valeria estar escondida. Por seu lado, os simulacros de jardim ou, em o preferindo, o faz de conta de não se viver aereamente, serão bons de ver em estando perto e não a esta distância.
Mas, caramba, eu gosto de ver isto! Cada uma destas janelas, e dos vasos, e da roupa, e das persianas, até das antenas parabólicas e da ferrugem que escorre pelos azulejos e estendais, me fala de quem lá vive, dos pequenos nada que constituem cada uma das vidas de quem atrás das vidraças vive e dorme, de quem aquele vestuário usa, de quem aquelas plantas rega.
E se o Ser Humano, na forma como existe enquanto indivíduo ou grupo, não é belo, então o conceito de beleza não existe, mais não sendo que pretexto para justificar os enquadramentos sociais, regras e consumos impostos.
Este prédio é bonito, pelo que é e pelo que significa.


Texto e imagem: by me

Está acabar...


... a época de praia.


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domingo, 19 de setembro de 2010

Fim ou início


Bem que sabia eu!
Que algures na cidade haveria de estar o início ou o fim dos trilhos de bicicleta.
Pintados no asfalto, a direito nos passeios ou atalhando pelos parques, vamos vendo estas vias ciclaveis que, diria eu, mais são cartões de visita eleitorais que outra coisa.
Não que não sejam úteis ou bonitos. Mais, o seu piso é óptimo para caminhar. Mas, diga-se em abono da verdade, é particularmente raro ver um ciclista a usá-las.
Ou porque há poucos ciclistas em Lisboa, ou porque os traçados são os mais cómodos para políticos, engenheiros de secretária e empreiteiros com olho para o negócio, verdade verdadinha é que nem em dias úteis nem nos inúteis os vejo.
Mas esse incrincado politicamente correcto haveria de começar (ou acabar) nalgum lugar. E é aqui, neste jardim que ombreia com hortas, couves, searas, poços e até uma nora.
Por cima das árvores podemos ver um dos novos hospitais privados da cidade. Se olhássemos para a direita, veríamos um dos templos do consumo, um centro comercial de grandes dimensões. Atrás à esquerda, um bairro residencial e de comércio, com vida própria e tradições na cidade. Atrás à direita, depois do cruzamento desnivelado de duas artérias de grande movimento, um estádio de futebol.
Onde estou? Em Benfica, pois claro.

Texto e imagem: by me

De peito para baixo


Será que quem assim abandonou este sapato terá alguma cota no fabricante para lhe fazer publicidade?

Ekseption - Toccata Live (1973)

Uma velharia, e porque não?

Abril em Portugal

Abril em Portugal, interpretado por Jacques Lannoy, e tocado em 1970 no carrilhão do Convento de Mafra.


Um olhar - Marta


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Cemitério Benfica

Numa paragem de autocarro




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sábado, 18 de setembro de 2010

A vítima


“- Ora boa tarde! Então vocemecê foi enforcar o bicho? Que mal é que ele lhe fez, homem?
- Mal não me fez, mas desde que ali está os cabrões dos melros nunca mais cá voltaram. Eles e o resto da passarada! Vai abanando, abanando e eu cá vou semeando e colhendo que é uma alegria.
- Então e importa-se que eu faça ali uma fotografia?
- Pois faça à-vontade, que já cá estiveram da televisão e tudo. Até cá esteve um filho-da-puta de um fiscal da câmara, que queria que eu tirasse daqui a vedação mais umas pedras que fui amontoando ali ao lado… Mas a senhora que vinha com ele piscou-me o olho, assim ‘tá a ver, e eu nem lhes liguei. E eles se quiserem a minha identificação, que vão lá à câmara, que têm lá a minha ficha. Trabalhei lá mais de quarenta anos e nunca faltei ou estive doente.”

Este diálogo aconteceu à tardinha, paredes-meias com o cemitério de Benfica, quase num beco atrás de uns prédios.
Confesso que, para além da conversa que ainda se esticou mais um pedacinho, ficou-me uma dúvida: Porque diabo hão-de murar os cemitérios? Quem lá está não vem para cá, quem cá está não quer ir para lá…?


Texto e imagem: by me

Ao vento


Entendo que tivesse sido deitado fora.
Lamento que tivesse sido escrito:

“Vagar cabeça levantada
Eu penso 1º em mim
Altivez o desprezo pelo inúteis
Sereno sensual assertivo
Sedutor”

O que irá na cabeça deste jovem?


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Fronteiras

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sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Sou enxertado em corno de cabra!


Não adianta o que possam dizer sobre o meu feitio. Faço e comporto-me porque o entendo e às opiniões dos demais pouca atenção dou.
No caso presente, refiro-me ao recusar-me a comprar ou usar produtos de origem francesa. A menos que seja a única solução e, mesmo assim, pondero-o seriamente.
Esta minha atitude advém do facto de a França ter, em 1995, testado o seu arsenal nuclear, à revelia da opinião dos seus parceiros políticos e militares, e antes de assinar um tratado de não proliferação de armas nucleares.
Bem pior que isso, foi fazê-lo no Pacífico, no quintal dos outros, por lá deixando os resíduos dos testes, no subsolo e nas águas.
A decisão de o fazer mereceu o apoio da maioria da população francesa, que não me recordo de ter ouvido ou lido protestos de maior. O que torna este acto, mais que uma decisão de um governo, uma decisão do país no seu todo.
O meu protesto, de então até agora, não impediu o acto. Mas impede, certamente, que os que o fizeram lucrem com o meu consumo, seja de que tipo de bens for. E, em podendo, faço disso alarde, tentando que os meus concidadãos me sigam as pegadas.

Lamentavelmente, os motivos para não consumir produtos franceses não param de aumentar.
A recente decisão, e sua concretização, de expulsar os ciganos Romenos e Búlgaros de solo francês, apenas reforça a aversão que tenho ao país e aos seus naturais.
É que, e para além dos tratamento discricionário para com uma minoria étnica (imperdoável em qualquer circunstância), esta atitude acontece agora com a crise económica, com o constatar que a França não cumprirá os acordos tidos para com a EU, como aliás não tem cumprido e inconsequentemente, como ainda acontece numa altura em que o desemprego grassa por toda a Europa, França incluída.
E se, tempos houve em que a mão-de-obra barata e não qualificada eram bem-vinda e em que todos os emigrantes eram bem recebidos, formal ou informalmente, acantonados em “Bidonville”, agora que os postos de trabalho escasseiam, há que correr com os que, eventualmente, podem competir com o nacionais por um salário qualquer.
Claro que, na sua maioria, os ciganos não iriam trabalhar de trolhas ou estivadores ou na apanha do tomate ou quejando.
Mas esta atitude governamental, com o apoio da sociedade francesa, serve de placebo pseudo-paliativo para a crise de emprego, fomentando as exclusões por nacionalidades ou etnias, em prol dos nativos.
E se a revolução francesa, com o seu mote “Liberdade, Igualdade, Fraternidade”, criou um novo e belo rumo para o mundo ocidental, a França pouco tem feito, neste último quartel, para honrar a sua história. Bem pelo contrário.
E enquanto me lembrar do que vai fazendo, não compro produtos com essa origem. E divulgo-o!
Digam o que disserem os demais, que eu sou enxertado em corno de cabra!


Texto e imagem: by me

2ª Circular, Lisboa

Numa paragem de autocarro




By me


A boneca


Quando cheguei a esta paragem de autocarro, já ela lá estava.
Com perto de um metro de altura, sentava-se dignamente no banco, esperando a menina que já tinha embarcado.
Depois, outros viajantes foram chegando, olhando desconfiadamente para a boneca.
E ninguém se sentou ao lado da boneca.
E alguém lhe levantou a ponta do vestido, tentando ver como estava composta.
E um outro alvitrou que, noutro país, seria de desconfiar se seria uma bomba disfarçada.
E um valentão foi lá verificar-lhe o peso.
E o autocarro chegou e embarcamos.
E eu levei comigo a recordação gráfica da boneca e este poema quase sabido de cor:


Teatro da Boneca

A menina tinha os cabelos louros.
A boneca também.
A menina tinha os olhos castanhos.
Os da boneca eram azuis.
A menina gostava loucamente da boneca
A boneca ninguém sabe se gostava da menina.
Mas a menina morreu.
A boneca ficou.
Agora já ninguém sabe se a menina gosta da boneca.

E a boneca não cabe em nenhuma gaveta.
A boneca abre as tampas de todas as malas.
A boneca é maior que a presença de todas as coisas.
A boneca está em toda a parte.
A boneca enche a casa toda.

É preciso esconder a boneca.
É preciso que a boneca desapareça para sempre.
É preciso matar, é preciso enterrar a boneca.
A boneca.
A boneca.

Poema: by Carlos Queirós
Imagem: by me

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Um conto, por Jorge de Sena



Este é um conto breve. É mesmo brevíssimo. De resto, se não fosse breve, muitíssimo breve, correria o risco de não ser um conto. A obrigação principal dos contos, mais que dos homens, é conhecerem os seus limites.
Propondo-me escrever um conto breve, tão breve como este, é-me impossível dizer qualquer coisa de mim. A brevidade não permite essas expansões, quase sempre vaidade, em que sacrificamos uma narrativa a nós próprios. Ora, se há coisa que não goste de sacrificar, ainda que a mim próprio, é uma narrativa. Claro que narrar não é, como todos sabem, o suficiente para escrever um conto. Mas também não é, como todos reconhecerão, uma coisa absolutamente necessária: mais, se o conto é breve, brevíssimo, o lugar para a narrativa estreita-se de tal modo, que ela quase não cabe; e, se a forçássemos, ela, como a intromissão das nossas pessoas o faria, ampliava os limites - aqueles limites que é preciso conhecer - para além do razoável num conto breve.
Porque, reconheçamo-lo, a brevidade é tudo. A brevidade permite contenção, prudência, reticência, pudor. O pudor é essencialmente uma virtude breve.
Sem dúvida, porém, que as virtudes, mesmo breves, não são comportadas pela brevidade de um conto brevíssimo. Além de que é ponto assente e demonstrado que as virtudes são inteiramente alheias, como virtudes, à estética literária. E um conto breve é, acima de tudo, uma obra de arte, de arte literária, onde tudo se reduz ao efeito artístico.
Contudo, na brevidade de um conto é extremamente difícil, senão impossível, preparar um efeito. Se não queremos, e eu não quero, apenas contar uma anedota, os limites razoáveis não dão azo a tais preparativos. Estes, à semelhança da perda das virtudes, requerem preparação, embora a perda propriamente dita possa ser praticamente instantânea, quer seja sentida no momento em que se perde (a virtude), quer seja uma descoberta mais tardia, quando alguém descobre que lhe fazia falta alguma coisa («coisa» é um modo de dizer) que afinal perdera. Num conto breve é tão duvidoso caberem as virtudes, quanto é duvidoso que se percam.
Lembro-me que, uma vez, em Londres, eu procurava com os olhos, parado numa esquina, a estação de correio, que era por ali perto. Eu tinha-me informado, e era por ali perto. Então uma senhora de idade, com óculos de aro de aço e uma couve repolhuda esticando uma saca de malha, parou ao meu lado, voltou-se para mim, afastou os cabelos grisalhos e sujos que apareciam caídos do chapéu de feltro preto, sem forma mas pontudo, e perguntou-me onde era a estação de correio. Imediatamente o meu olhar, depois de ter fitado o casacão cinzento e os sapatos rasos com fivela grande, que eram o resto da imagem dela, percorreu os prédios - todos georgianos com janelas brancas nas paredes de outro branco - e viu a estação de correio. Apontei-lha, e a senhora agradeceu com efusão, e atravessou a rua. Quando ela atravessava, dei passos pelo passeio, e vi, numa montra que era uma janela, um chinês de porcelana, coberto de pó. E, repentinamente, voltei atrás, porque não tinha - verifiquei - nenhuma carta para deitar no correio (havia um marco de correio ao pé de mim) e não queria comprar selos (tinha selos no bolso).
Não posso esquecer a brevidade deste episódio, não por ser episódio, que o não é, nem sequer por eu saber ou não saber a razão de não poder esquecê-lo. Já pensei que isto se relaciona com o retrato de uma velha, que vi no jornal, não sei se no dia seguinte, assassinada numa estação de correio. Mas, se bem me lembro, a estação de correio era noutro bairro. É provável, todavia, que a razão (de eu saber ou não) resida apenas na brevidade, uma brevidade insignificante, insignificada, sem conteúdo algum, como o pudor, tão breve essencialmente.
Mas, reflectindo melhor, talvez que a brevidade não desculpe a ausência de atenção com que jamais aproveitei um acidente. A não ser que seja a hesitação natural (e já reflectida) em ver, neste acidente, um incidente. É uma diferença da maior importância para o conhecimento dos limites. E os limites, que é tão imperioso conhecer, eles só, e mais nada, nos autorizam as definições. Sem definições, a brevidade não existe, não se realiza, da mesma maneira que, com elas, não tem essência própria nem estrutura virtual. E um conto breve, brevíssimo, que seja a própria desistência de narrar (e narrar implica, reparemos, interpretar ou, pelo menos, escolher), e em que passemos incógnitos (embora não fora do tempo e do espaço), não sendo mais nada, será por certo a brevidade impreparada, a brevidade captada, a brevidade em si, tanto mais que, no caso presente, eu nunca mais tornei a ver aquela velha, mesmo que (a não ser que ela fosse a do retrato) outras vezes me tenha cruzado com ela na rua. Não muitas, nessa hipótese, porque parti pouco depois (exactamente pouco, não garanto que tenha sido) para a Bélgica. A brevidade, porém, isenta-nos de quaisquer perigos. Ora os perigos são, quase sempre, muito breves. Pelo que poderemos concordar em que este conto é brevíssimo.

Texto: by: Jorge de Sena, 1961
Imagem: by me

A passageira


A meio da tarde.
Do meu banco de comboio vejo-a entrar na carruagem.
Não se sentou e ficou entre portas a analisar, de sobrolho franzido, o mapa de estações que ali está.
As cores garridas do seu vestuário, o cheiro a novo do estojo de plástico que segurava, junto com algumas poucas folhas, não deixava azo a dúvidas.
A estação seguinte era a minha. Entre os meus 1,72 e os dois e pouco da porta, ficaram os seus pouco mais de 1,40 metros.
Por cima do ombro, consegui ver o que estava escrito numa das folhas pautadas e perfuradas:
“Lição nº1
Sumário
Apresentação. Considerações gerais sobre a disciplina de ciências.”
Quando a composição parou, bem que jogou a mão ao botão da porta, mas a inexperiência ou a falta de força não lhe permitiram abri-la. Acabei por o fazer, com um sorriso.
O rubor que lhe subiu às faces condizia com o estojo que segurava.
Silenciosa como tinha entrado, saiu para ao cais, saltitando em direcção às escadas.
Como é bom voltar às aulas!


Texto e imagem: by me