quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Três coisas difíceis no dia-a-dia


Difícil mesmo de entender é o motivo de se encontrar com tanta frequência na rua caçado abandonado. Em regra são sapatos, botas ou chinelos isolados, desirmanados, tão solitários e tão sem préstimo assim sozinhos que dificilmente poderão ser de valor para alguém. Mas um par completo como este, abandonado na plataforma de embarque ferroviária é ainda mais difícil de entender. Mistérios…
Difíceis de encontrar são condutores automóveis que, em dia de chuva, se afastem dos passeios e das poças de água. E que, com isso, evitem molhar ou salpicar os transeuntes que, em marcha ou aguardando oportunidade de atravessar a rua, não estão alertas para as águas lamacentas que jorram de sob as rodas. Haverá, certamente, uma teoria que explique este comportamento dos automobilistas, esquecidos que estão que, fora do carro, também são alvos potenciais de quem está ao volante e nos peões não pensa. Bem que o gostaria de saber, para justificar o ter tido que voltar a casa para mudar de calças, após ter tentado atravessar a minha rua por via de um cafezinho matinal.
E difícil é conseguir ter uma conversa política. Não me refiro às politiquices, em que se discutem as honestidades ou não desta ou daquela figura. Nem os relacionamentos e as práticas pouco claras ou o jogo do “diz-que-disse-e-não-disse” do quotidiano politico-partidário.
Refiro-me mesmo a conversas sobre ideias de como a sociedade pode ou deve funcionar. As opções entre a direita, o centro e a esquerda, bem como os respectivos extremos. Se aquilo que descontamos ou pagamos de impostos deve ou não servir esta ou aquela abordagem da gestão da coisa pública e da sociedade.
Se devemos optar por nos organizarmos de acordo com a teoria da evolução de Darwin, em que a sobrevivência é a dos mais aptos, ficando os restantes pata trás, ao serviço dos primeiros, isto se para tal forem capazes ou úteis. Ou, por outro lado, se devemos partir do principio que os homens nascem iguais, iguais morrem e que, entre um ponto e o outro, iguais devem ser e viver, tirando partido da heterogeneidade das suas diferenças e potenciais. Diferenças de aspecto, diferenças de capacidades físicas, diferenças intelectuais. Ou, ainda, entre uma posição e a outra e quanto de uma e de outra deve ser levado em linha de conta. Ou nenhuma delas.
E, quando tentamos escalpelizar estas e outras ideias, a atitude generalizada é a de transferir a responsabilidade dessas decisões para os políticos e governantes eleitos, escolhidos pelas simpatias que provocam, pelos beijos que dão ou pelas palavras bonitas que usam.
Quando, mais tarde, são confrontados com as falências do sistema, quando se confrontam com gente licenciada que mais não consegue fazer que tirar bicas num tasco, quando são solicitados para substituir o Serviço Nacional de Saúde por seguros privados de saúde e constatam que estes não pagaram nada a quem contrair a gripe A, que isso iria lesar gravemente as seguradoras, quando descobrem que algumas decisões judiciais acontecem devido aos altos honorários de alguns advogados e não na sequência lógicas dos factos, quando se constata que há quem deita comida fora todos os dias e há quem se alimente desses mesmos restos todos os dias…
Quando são confrontados com tudo isto e bem mais, transferem as responsabilidades para os governos, para o sistema, para a EU, para tudo quanto é coisa menos para si mesmos, e para o facto de não se debruçarem a sério a definir o seu próprio futuro.

Se a primeira dificuldade me deixa intrigado e a sorrir e se a segunda me faz zangar e proferir alguns palavrões, já a terceira me deixa triste pelo fraco tino dos meus concidadãos.


Texto e imagem: by me