terça-feira, 28 de julho de 2009

Eu sou Tótó!


Pelo menos é a opinião que cerca de noventa por cento das pessoas com quem conversei. Mas eu conto.
Avariou-se uma peça de um equipamento vital para um trabalho que tenho em mãos. Esse equipamento tem características únicas e, ao que sei, deixou de ser fabricado.
Procurando pela peça em causa junto do fabricante, via web e telefone, não a encontrei. A sua substituição por outra, construída ou adaptada por mim é possível mas cara, difícil e morosa.
A solução encontrada foi a de comprar um equipamento completo, onde essa peça constasse, ainda que sabendo que o conjunto não respeitaria as especificações e necessidades que o meu projecto tem. Mas sempre aproveitaria a tal peça para substituir a avariada. E encontrei o que procurava. A peça funciona com quero mas o equipamento, no seu todo, estava avariado com um defeito de fabrico.
Para solucionar a questão, fiz o que se me afigurou por mais lógico e correcto: contactei a loja, expliquei o problema – a avaria e a minha necessidade da peça – e propus trocar todo o conjunto por um novo, que haveriam de mandar vir de outra loja ou do representante. Assim ficou combinado e é uma questão de dias.
Em contando toda esta situação a diversas pessoas, fiquei surpreendido com o que me foi aconselhado fazer:
Discretamente trocar a peça que eu queria na embalagem do equipamento e devolver o conjunto. Ser-me-ia devolvido o dinheiro do negócio e eu ficaria com a peça nova sem que, na loja, se apercebessem da coisa, até porque, em regra, nessas lojas pouco sabem dos detalhes do que vendem.
Claro que fiquei, mais que surpreendido, incomodado com a proposta! Sendo exequível é também desonesta! E, se o tivesse feito, mais que ter resolvido o meu problema, ficaria com um peso na consciência e dificuldade em dormir por uns tempos largos!
Mas esta estória – o meu problema e a solução que muitos me apresentaram – serviu para outra coisa: ficar a conhecer com mais profundidade algumas das pessoas com quem me relaciono: o seu “Chico-Espertismo” e o seu grau de honestidade.
E honra seja feita aos dez por cento dos meus interlocutores que assumiram uma atitude de honestidade natural que, se na altura nada me disse, agora me faz sorrir de satisfação.
Quanto aos outros noventa por cento, que me chamaram Totó, sempre lhes digo que tenho orgulho em o ser por estes motivos!

P.S.
Depois de escrito o rascunho do acima escrito, fui acertar o negócio na loja, que o equipamento novo e completo já tinha chegado.
Para azar meu e espanto conjunto, o novo que havia chegado tinha exactamente a mesma avaria, sem tirar nem por. Nem eu nem quem me atendeu, com idade para ser meu descendente, queríamos acreditar no que estávamos a ver. E ficámos a olhar um para o outro e para a avaria, sem saber que fazer.
Até que, do outro lado do balcão, me foi sugerido que fizesse aquilo mesmo que eu não havia querido fazer. Dito à boca pequena, não fosse mais alguém ali ouvir.
E, com desgosto meu, acabei por ser desonesto: voltei a casa, troquei a peça na caixa do equipamento, e voltei à loja, onde entreguei o conjunto e me foi devolvido o dinheiro.
A loja, mero intermediário entre fabricantes e clientes, em nada ficará a perder, que o devolverá ao representante. Este, de um grande e internacional produtor, considerará esta avaria como uma gota de água no seu orçamento imenso e nem lhe dará atenção. Eu, fiquei com o meu problema resolvido e a custo zero. Prejuízo nulo para os intervenientes!
Excepto para a minha consciência, que continuará a dizer que fiz um acto desonesto, consciente e com a recomendação e cumplicidade da sociedade em que me insiro. Que me chama Totó por não o ter querido fazer.
Que os deuses me perdoem por o ter feito!


Texto: by me
Imagem: be by me

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