quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Os calores do consumo


Eu tenho um termómetro. A bem dizer, tenho mais que um: tenho um clínico, ainda de mercúrio, tenho um de máxima e mínima, de mercúrio e álcool e tenho dois electrónicos, daqueles de parece ou de secretária, cujos mostradores, estilo ecrã, nos vão dando diversas indicações: temperatura, pressão atmosférica, grau de humidade, etc.
Em boa verdade, tenho-os fruto de impulsos de momento, comprados porque gostei das funções ou do aspecto. Mas a principal importância em os possuir é confirmar uma das “Leis de Murphy”: “Dois aparelhos de medida iguais, em circunstâncias idênticas, dão resultados diferentes!”
Assim, quando quero ter algum rigor sobre a temperatura ambiente, leio as indicações dos três, tiro a média às variações que possuem e fico com um valor que, possivelmente, é muito próximo da realidade.
Mas o uso quotidiano que lhes dou pouco tem a ver com rigores mas antes com sensações. Se sinto que tenho muito frio ou muito calor, olho a indicação de um deles. Se o que lá leio não corresponde ao que sinto, não há justificação para ligar o aquecimento ou a ventoinha: é mesmo a minha imobilidade que provoca essa sensação. Trato assim de me mexer, de sair para um café ou semelhante, activando assim a regulação corporal de temperatura. Acabo por poupar energia (tema ecológico), faço bem ao coração (questões de saúde) e quebro a rotina e o imobilismo (a psique e o bom humor agradecem).

Acontece que lá, onde trabalho, existem sistemas de ar condicionado. Para a manutenção das temperaturas ideais de certos equipamentos e, acessoriamente suponho, para conforto de quem lá labuta.
Mas, nestas questões de conforto térmico, as opiniões divergem tanto quanto as cabeças: há sempre quem se queixe de estar ou muito calor ou muito frio. Consenso, nesta matéria, é coisa inexistente.
Vai daí, o comando de temperatura de algumas salas onde trabalho é usado e abusado por aqueles com mais iniciativa ou mais queixosos. Ou ainda pelos mais discretos, que alguns o fazem apenas quando mais ninguém os está a ver.
Pois um destes dias, cansado que estava de tantas reclamações ouvir, pensei em calar de facto as vozes protestantes e, frequentemente, sem razão: decidi levar um termómetro e tê-lo bem visível para quem ali trabalha. E, de cada vez que se queixarem, fazê-los ver o valor real de temperatura da sala. Tratei assim de escolher um dos meus, aquele cujo mostrador fosse maior e legível a maior distância.
Acontece que, pela pouca leitura que deles de facto faço em casa, se encontrava com as pilhas descarregadas, ecrã vazio de informação. Bem, haveria que comprar novas, duas daquelas quase comuns nos quiosques e lojas de traquitanas ou supermercados: formato AAA.
E, a caminho do trabalho, aparelhómetro no saco, entrei numa loja e pedi as duas que queria. Fiquei a saber que não me venderiam duas, que apenas possuíam embalagens de quatro e assim as venderiam. Sendo que só queria mesmo duas, agradeci e saí, em busca de outro ponto de venda. No seguinte obtive a mesma resposta. Assim como no terceiro local que as possuia. Em concreto, tratou-se de uma loja de electrónica de consumo, de uma loja de artigos fotográficos e de uma papelaria/tabacaria, toda elas no centro comercial cá do meu bairro.
Mas, confesso, fiquei chateado com a situação: porque raio haveria eu de ser obrigado a comprar mais do que queria? O uso que dou a este produto é restrito, as pilhas têm, tal como outros artigos, prazo de validade e, quando fosse pelas extra, pela certa que já não teriam a carga que se espera de pilhas novas. Não! Se apenas queria duas, apenas duas haveria de comprar!
Acabei por satisfazer esta minha necessidade – e teimosia, é verdade – no quiosque na estação. Onde se pode comprar, para além de tabaco, jornais e revistas, também bonecas, fascículos, gomas, cachecóis de clubes de futebol, carregar cartões telefónicos, pagamentos de contas domésticas e uma míriade outras coisas. E também pilhas!
Aqui, não estranharam o meu pedido. Tiraram uma embalagem que, a olho nú, seria de umas dez pilhas ou mais, contaram as que eu queria e entregaram-mas sem mais observações ou restrições que não fosse se eu teria umas pequenas moedas (não recordo de que valor) para ajudar no troco do pagamento das pilhas e do tabaco.

O problema que se põe, nos tempos que correm, é que se compra ou obtém não aquilo que se quer mas antes aquilo que fabricantes e comerciantes querem que compremos ou tenhamos. Por via da publicidade, mais discreta e subtil ou francamente agressiva, ou por via das embalagens, que nos obrigam a pagar na caixa mais do que queríamos. Trazer quatro artigos quando, efectivamente, só se necessita de dois é, em primeira e última análise, um mau negócio para quem compra.
Ser consumidor consciente implica, entre outras coisas, não aceitar aquilo que nos impingem mas obter aquilo que se quer, ainda que possa dar mais trabalho. E lembrarmo-nos de um velho ditado popular que diz: “O barato sai caro!”
Já agora, que tiveram todo o trabalho de ler este texto, não se esqueçam que existe o “pilhão”!




Texto e imagem: by me

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