sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Documento não editado!


Nesta imagem não sou eu a trabalhar com a câmara de televisão. Apenas quatro anos e dois meses depois deste primeiro 1º de Maio (para ser bem exacto) eu começaria a exercer o ofício.
Também não fui eu que a captei. Apesar de, à época, já dispor de câmara de cinema de super 8mm, bem como a moviola e da coladeira, o poder familiar não permitiu que o entusiasmo da adolescência fosse para o meio da multidão festejar. A alegria era muita mas os receios e as incertezas também.
Esta imagem, melhor, a bobina original de filme e, mais tarde, a sua cópia digitalizada, chegou às minhas mãos por mão amiga, também não ela a que originalmente as captou.
A ética de aqui colocar este documento particular sem autorização do seu dono não é grande coisa. Mas mais que ser propriedade de alguém, este filme de pouco menos de quatro minutos e mudo (as câmaras de cinema amador de então não o permitiam fazer de outra forma, que este era o tamanho possível de uma bobina) este filme é, dizia, parte da memória de um povo – o nosso!
E constate-se não apenas os cidadãos anónimos que ali estiveram como também nas caras conhecidas (repare-se no semblante espantado do então não tão idoso Mário Soares no meio da multidão).
Esta festa, a festa maior de muitas dezenas de anos que a antecederam ou sucederam, faz parte de cada um de nós. Dos que a viveram, dos que a fizeram, dos que a permitiram que acontecesse e dos que, menos afoitos ou mais distantes, lá não puderam estar.
A versão aqui colocada está musicada. Esta opção é minha, recorrendo ao meu arquivo fonográfico. O tema musical foi ouvido então, ou durante algum tempo depois, vezes sem conta nas rádios e na televisão, que só havia uma então. Nunca chegou a ter foros de hino do evento, mas todos os que o viveram, mais de perto ou não tanto, essas épocas, não poderão ficar indiferentes ao ouvi-lo. Aos acordes e às palavras.

E, comparando o que então se viveu com o que se vive hoje, apenas digo que não estávamos enganados.
Efectivamente, “O povo unido jamais será vencido!” O que aconteceu, para mal dos nossos pecados, é que não fomos capazes de ficar unidos no nosso desejo de uma sociedade melhor e que as divergências de horizontes e de ideias se sobrepuseram a esse construir de futuro.
Do que foi feitio uma semana antes de esta imagem ter sido captada sobrou a liberdade de pensamento e expressão e o exercício da democracia. O que não é nada pouco, cuidem-se os desavisados!
Mas o desinteresse dos cidadãos do exercício da democracia e o respectivo alijar de responsabilidades do construir do futuro para com a classe política em exclusivo têm levado a que esse mesmo exercício da democracia e da liberdade estejam em risco.
Os sinais estão aí, mais ou menos dissimulados em legislações avulsas e práticas não aclareadas.
O não nos acautelarmos com esta evolução implicará, num futuro talvez não tão distante quanto isso, a que haja motivos para fazermos e celebrarmos outra revolução.
Nessa altura, conto poder estar lá em cima, a transmitir para todos que ela acontece. Ou cá em baixo a celebrar e a fazer outros registos. Ou, quem sabe, a ser parte integrante dos que terão feito algo para mudar e justificar a festa. Para mudar este rumo, quase nefasto, que levamos.
O que começa a ser urgente fazer!


Imagem: Unknown
Música: "Portugal ressuscitado", by InClave/Tonicha/Fernando Tordo
Texto: by me






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